sexta-feira, 28 de fevereiro de 2020

O 7º continente, a economia da longevidade e os fundos de pensão 2.0 - Parte 4






PARTE 4

A economia da longevidade e seu ecossistema

economia da longevidade vai remodelar o sistema financeiro global e causar (dis)ruptura nos modelos de negócio dos fundos de pensão, companhias de seguros, bancos de investimentos e economias de países inteiros. Ela não passa apenas pelo sistema financeiro. Envolve um verdadeiro ecossistema com vários segmentos e subsetores e fará convergir áreas hoje distintas, como medicina e finanças.

Nunca a história humana viu surgir uma economia tão abrangente e intrincada quanto a economia da longevidade. Uma economia multisetorial, interdisciplinar, conectando dimensões em um nível sem precedentes.

Orbitam e se interconectam nesse ecossistema de extrema abrangência, centenas de iniciativas, indústrias, domínios de ciência e tecnologia. Envolve áreas como biotecnologia, biomedicina, gerociência (estudo do envelhecimento), medicina preventiva, bancos, fintechs, healthechs, insuretechs, agetchs, wealthtechs, neobankschallenger banks sistemas de previdência, políticas governamentais ... 

Seu alto nível de complexidade representa um risco substancial para os atuais modelos de negócios – fundos de pensão incluídos – porque dificulta de maneira significativa a habilidade das organizações, investidores e mesmo governos em antecipar desafios e identificar oportunidades.   

Entender e transformar em iniciativas inovadoras a esmagadora e complexa quantidade de informações dessa nova economia, pode parecer algo intransponível. Porem, as mesmas ferramentas que permitiram o progresso em outros setores de alta complexidade – análises quantitativas, big data, inteligência artificial - podem ser acessadas e adaptadas para permitir uma compreensão mais profunda da economia da longevidade e para modelagem de soluções.

Na figura abaixo, da Aging Analytics Agency, um exemplo do ecossistema da longevidade na Suíça



Ciência do envelhecimento

Compreender e gerenciar o envelhecimento é algo crucial para a economia da longevidade. Não por acaso, as pesquisas e desenvolvimentos na área da ciência do envelhecimento, a “gerociência”, possuem um papel preponderante nesse ecossistema. Os avanços da biomedicina e biotecnologia começam a nos permitir entender os mecanismos subjacentes ao envelhecimento biológico. Isso está levando ao desenvolvimento de terapias que agem diretamente sobre esses mecanismos para reduzir o processo biológico do envelhecimento na sua fonte. A biotecnologia e a biomedicina estão na vanguarda dos avanços na ciência do envelhecimento.      

A medicina será personalizada, precisa, preventiva e participativa (conhecida como Medicina P4 ou P4 Medicine) e se afastará da abordagem atual baseada no tratamento e cura padronizados aplicadas de modo massificado e indistinto depois que a doença se instalou. Ao invés de medicamentos bem-sucedidos mundialmente, serão utilizadas drogas cada vez mais personalizadas, que agirão com precisão para tratar sob medida pacientes e casos individuais com base na idade, gênero, etnia, genética e estado de saúde. 

Essas e outros tecnologias, a “medicina de precisão” (precision medicine) e a “medicina regenerativa” (regenerative medicine) vêm sendo desenvolvida em vários lugares, mas principalmente numa região chamada de BioValley ou Longevity Valley. Um enclave que se expande ao longo da Alemanha, França e Suíça, abrigando as mais avançadas instituições de pesquisa cientifica nas áreas de biotecnologia e biomedicina, como a Universidade da Basileia, o Instituto Max Planck e a Universidade de Freiburg.

Na economia da longevidade, o prolongamento a vida será indissociável das soluções da área financeira e esses setores caminharão juntos. Vislumbramos uma intersecção entre longevidade e finanças.

Na quinta parte do artigo falaremos das AgeTechs e WealthTechs que compõem o ecossistema da longevidade. Fique ligado, acompanhe, questione, comente.

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Eder C. da Costa e Silva é sócio-gerente e fundador da E.Carva Investimentos & Participações e autor do livro “Revolucionando os Conselhos dos Fundos de Pensão” (ed. PoloBooks, 2020) que será lançado em breve.

terça-feira, 25 de fevereiro de 2020

O 7º continente, a economia da longevidade e os fundos de pensão 2.0 - Parte 3







PARTE 3

Dilemas dos aposentados pela previdência complementar 

Se nos voltarmos para os fundos de pensão perceberemos que seus esforços sempre foram muito mais focados nos participantes durante a fase de formação da poupança e bem menos em ajudar os aposentados a gerenciarem essa poupança durante a fase de recebimento do benefício. 

Talvez porque o sistema de previdência complementar que herdamos se propusesse, originalmente, a pagar rendas vitalícias, espelhando os sistemas de previdência oficiais. Com o futuro dele garantido, para quê se preocupar em ajudar o aposentado a fazer sua renda de aposentadoria durar não é mesmo?

Porem, o sistema de previdência complementar fechado (fundos de pensão) avançou e foi se transformando. Vieram os planos de contribuição definida e as rendas vitalícias foram aos poucos sendo empurradas para os livros de história da atuária. 

O participante pode escolher hoje, ao se aposentar, se quer receber mensalmente um percentual do saldo de conta acumulado, se quer fixar um número de anos para receber sua renda e em alguns planos pode até mudar essas escolhas todo ano.  Nas formas de pagamento do benefício que surgiram, o aposentado passou a ser o responsável pela gestão da renda, por esticar seu dinheiro o máximo possível no tempo.

Aquela antiga preocupação de morrer cedo e deixar a família desamparada, cedeu lugar ao medo de viver demais e o dinheiro acabar. Aliás, a geração grisalha dos nossos dias vive a dicotomia de duas realidades, outrora estanques: ao mesmo tempo em que continua a trabalhar, geralmente como PJ, supostamente na fase de poupar para a aposentadoria vai usando sua previdência complementar para viver.

Diante de poucas ferramentas e soluções para essas novas realidades, a angústia de fazer durar o máximo possível o dinheiro economizado durante uma vida, só faz aumentar. Planos de contribuição definida foram idealizados para ambientes de retornos estáveis ou crescentes e expectativas de vida, digamos, comportadas.

Acontece que nosso mundo é tudo, menos comportado. A longevidade vem aumentando continuamente, seguindo uma tendência que deverá continuar na medida em que novas tecnologias que buscam uma longevidade saudável entrem em cena. 

Do lado dos investimentos, vale ler um artigo super interessante publicado pelo Bank of England agora em janeiro/2020, intitulado “Eight centuries of global real interest rates, R-G, and the ‘suprasecular’ decline, 1311–2018". 

Eles reconstruíram a taxa real de juros global em bases anuais retroagindo ao século XIV e cobrindo 78% das economias desenvolvidas (gráfico abaixo). Mostraram que a taxa real de juros nunca foi "estável" e que depois da turbulência monetária do fim da idade média, prevaleceu uma tendência de queda entre 0,6% e 1,6% por ano nas taxas reais. 

O trabalho sugere que, independentemente de respostas fiscais e monetárias específicas, as taxas de juros reais podem em breve entrar em território negativo permanente! (Paper completo aqui: https://bit.ly/2tHv0O8


Um cenário desses faz até mesmo os maiores especialistas em investimento e atuaria coçarem a cabeça. Sem uma evolução rápida, o modelo de negócios atual dos fundos de pensão e das instituições financeiras tradicionais, é insustentável. 

No ponto de inflexão em que nos encontramos, as demandas e necessidades da geração prata começam a entrar no radar das startups e demais players do ecossistema da longevidade, novas soluções são inexoráveis.

Na quarta parte do artigo discorremos sobre a economia da longevidade e seu ecossistema. Fique ligado, acompanhe, questione, comente. 

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Eder C. da Costa e Silva é sócio-gerente e fundador da E.Carva Investimentos & Participações e autor do livro “Revolucionando os Conselhos dos Fundos de Pensão” (ed. PoloBooks, 2020) que será lançado em breve 


sábado, 22 de fevereiro de 2020

O 7º continente, a economia da longevidade e os fundos de pensão 2.0 - Parte 2





PARTE 2


O sétimo continente e o tsunami grisalho

Tomei conhecimento pela primeira vez sobre a figura do 7º continente através de um artigo da Margaretta Colangeno da Deep Knowledge Ventures & Longevity Capital. Se isolássemos mundialmente em um continente hipotético todos os cidadãos que hoje estão aposentados e que tem acima de 60 anos, teríamos um sétimo continente, vasto e rico. 

Essa extensão de terra seria habitada por um bilhão de pessoas com um poder de compra anual, de acordo com a Aging Analytics Agency, equivalente em 2020 a US$ 18 trilhões (figuras abaixo). Esse é o tamanho do que alguns especialistas estão chamando de Global Longevity Industry ou Longevity Economy, o equivalente em português à “Industria Global da Longevidade” ou “Economia da Longevidade”.

Você deve estar cansado de ouvir demógrafos e atuários projetando os efeitos populacionais da longevidade. As pirâmides demográficas invertidas se tornaram mais comuns na mídia do que as próprias pirâmides do Egito. Até hoje, porém, são raras as análises que colocam nessa cena a evolução dos efeitos sociais e econômicos do aumento contínuo da longevidade em escala global.  

Projetada para 2026, a Industria Global da Longevidade na qual aquela turma do sétimo continente são os consumidores, terá um poder de compra igual a um monte Everest de dinheiro, o equivalente a um PIB de US$ 26 trilhões.



Os americanos cunharam o termo silver generation (“geração prata”) para se referir ao contingente de pessoas aposentadas cujos cabelos - quando existem - são brancos ou cor de prata. Às vezes também os chamam de gray generation, que significa “geração grisalha”.
  
A verdade é que os cidadãos do sétimo continente, esse verdadeiro tsunami grisalho que vai se formando, nunca tiveram sua existência nem suas necessidades financeiras reconhecidas isoladamente.

Existem vários termos para nos referirmos aos mais novos: nenês, crianças, adolescentes, jovens. Temos inúmeras maneiras para chamar os mais crescidos: adultos, maduros, experientes, desenvolvidos. Também temos muitos meios para rotular os mais velhos: idosos, longevos, anciãos, centenário, supercentenário - que é aquele com mais de 110 anos de idade. 

Agora pense bem, quais os termos que caracterizam a geração prata ou geração grisalha? Uma categoria demográfica que surgiu com o aumento da longevidade, espremida entre os adultos e os “bem mais” idosos. Pensou? Pois é, não tem.
  
Esse contingente que inexiste na lexicografia, também inexistia até aqui para o sistema financeiro tradicional, mas ele cresceu muito e não pode mais seguir ignorado. TINA2, diria a Dama de Ferro ao se dirigir ao sistema financeiro.

(2) TINA, outra expressão muito usada na Internet, é abreviação do inglês "There Is No Alternative” e significa: "não há alternativa". A criação desse slogan político é atribuída a Margaret Thatcher, a Dama de Ferro, quando primeira-ministra do Reino Unido e usada para indicar que não havia alternativa às leis do mercado.

Novos tipos de instituição financeira e produtos começam a surgir para satisfazer as necessidades dessa população. Bancos, gestores de investimentos, fundos de pensão e seguradoras estão nos primórdios da evolução para novos modelos de negócios. 

As soluções oferecidas por essas instituições remodeladas serão otimizadas para atender as necessidades desse povo. Moldados na economia da longevidade, produtos e serviços serão muito mais age-friendly, ou seja, adequados às pessoas que estão envelhecendo. Operar e fazer transações financeiras, será mais fácil e seguro para as pessoas mais seniores e a inteligência artificial será usada largamente para processar a enorme quantidade de dados disponíveis e ajudar no desenvolvimento de soluções especificas. Prepare seu passaporte para o sétimo continente, você vai precisar dele, muito em breve. 

Na terceira parte do artigo falaremos sobre os dilemas enfrentados por aposentados pela previdência complementar. Fique ligado, acompanhe, questione, comente. 

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Eder C. da Costa e Silva é sócio-gerente e fundador da E.Carva Investimentos & Participações e autor do livro “Revolucionando os Conselhos dos Fundos de Pensão" (ed. PoloBooks, 2020) que será lançado em breve.


segunda-feira, 17 de fevereiro de 2020

O 7º continente, a economia da longevidade e os fundos de pensão 2.0 - Parte 1




PARTE 1

O contexto

Conforme pensamento instigante de Abraham Maslow, “se a única ferramenta que você tem é um martelo, você tender a ver todo problema como um prego”.

Em 1880 o chanceler Alemão Otto von Bismarck criou o primeiro sistema de aposentadoria público. Definiu uma idade a partir da qual as pessoas parariam, abruptamente, de trabalhar. Estabeleceu uma renda, a ser paga vitaliciamente pelo estado e vislumbrou na tributação dos trabalhadores ativos e empresas a forma de financiar o sistema. A expectativa era de que depois de aposentado, o sujeito viveria apenas alguns anos a mais recebendo o benefício.

Passados 140 anos, uma convergência de fatores tornou tudo aquilo ultrapassado. Trabalho hoje é um conceito fluido, dissociado do tempo. Não paramos mais de trabalhar abruptamente para ficar desocupados (veja mais aqui: https://bit.ly/2tbJO7A).  Nem vivemos pouco tempo, ao contrário, vivemos muuuuuito tempo, o que torna impossível pagar a conta da renda vitalícia. Lá se foi a grande sacada de Bismark. Fim do conceito de aposentadoria! 

O problema mudou, mas continuamos com a mesma solução mundo afora. Vamos esticando a idade de aposentadoria, reduzindo o valor do benefício, tentando retirar o reajuste pela inflação. Puxando daqui, esticando dali. Os remendos vão dando uma sobrevida ao conceito criado pelo velho Bismark. Desesperados em fazer funcionar um sistema que não sabemos pelo quê substituir, vamos eternizando o antigo dogma Bismarkiano, em uma dissonância cognitiva coletiva, um permanente transe de negação e uma visão de túnel que nos impede de enxergar além.

Emprego? Me diz você, existe algo mais instável hoje do que um emprego? As grandes corporações, com milhares de empregados, caminham para a extinção. As que sobrarem, se sobrarem, serão poucas e para poucos. As organizações do futuro serão enxutas, abrigarão poucos funcionários e os contratos de trabalho se afastarão totalmente do atual modelo assalariado. Os fundos de pensão, que nos moldes atuais são uma vaquinha societária para ajudar os empregados de grandes empresas a pouparem juntos para o futuro, vão simplesmente perdendo o sentido de existir. Na Holanda existiam 605 fundos de pensão patrocinados por empresas em 2007, em 2019 esse número havia caído para 162.

A consolidação e redução da quantidade de fundos de pensão é um fenômeno global. Os quase trezentos fundos de pensão brasileiros - eram cerca de 365 no pico - já perceberam isso e vem tateando no escuro em busca de uma solução. Alguns estão ensaiando a implantação de planos para cônjuges e dependentes dos atuais participantes. Talvez sem ter se dado conta de que os próprios participantes, empregados com vínculo empregatício permanente em tempo integral, estão sumindo e com eles sairá de cena esse “novo” publico alvo. Outros estão de olho nos planos de funcionários públicos de estados e municípios, sem perceber que esse é um exemplo do “Efeito Orloff” na sua essência mais pura: eu sou você amanhã, diriam os fundos do setor privado para os do setor publico. 

Esse longo artigo, que será publicado em sete artes, pretende transmitir um TL;DR1 sobre o impacto que a longevidade, as novas relações de trabalho e a convergência de diferentes tecnologias deverão causar no sistema financeiro em geral e na indústria dos fundos de pensão em particular. 

(1) TL;DR (ou tldr), expressão usada pela garotada​ é uma abreviação do inglês "too long" e "didn't read" que significa "longo demais" e "não li". Se por um lado esse acrônimo critica os textos com tamanho excessivo na Internet, por outro, também tem sido usado de forma espirituosa e sarcástica para resumir uma história muito mais longa ou um assunto muito mais complicado.

Na segunda parte do artigo abordaremos o sétimo continente e o tsunami grisalho. Fique ligado, acompanhe, questione, comente. 

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Eder C. da Costa e Silva é sócio-gerente e fundador da E.Carva Investimentos & Participações e autor do livro “Revolucionando os Conselhos dos Fundos de Pensão" (ed. PoloBooks, 2020) que será lançado
em breve.

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