De São Paulo, SP.
quinta-feira, 4 de maio de 2017
Porque a política de redução dos juros do Banco Central Brasileiro e do Banco Central Europeu poderá causar grande impacto nos fundos de pensão
De São Paulo, SP.
Em 2015 o Banco Central
Europeu (EBC – European Central Bank)
anunciou um programa de expansão de compra de ativos chamado de QE - Quantitative Easying (Flexibilização
Quantitativa, em tradução livre). O
programa era parte da política de estabilidade de preços do EBC e levou,
posteriormente, a redução da taxa de juros. É difícil determinar o impacto
exato do programa sobre as taxas de juros, mas o Banco Central Europeu estimou
que o impacto nos títulos com prazo de 10 anos foi uma redução dos juros da ordem
de 47 pontos base.
Os fundos de pensão na
Holanda tem um patrimônio da ordem de €1,3 trilhões – 168% do PIB do país. Cerca
de 94% desse patrimônio pertence a planos de benefícios definidos. Nesse tipo de plano os benefícios são
“garantidos” de modo que cortes nas rendas de aposentadoria só são permitidas pela
legislação holandesa como último recurso.
Por serem “garantidas”, o
órgão regulador da previdência complementar holandesa determina que os fundos
de pensão usem como fator de desconto no cálculo de suas obrigações, a taxa de
juros livre de risco na economia. Isso
faz com que os fundos de pensão holandeses, da mesma forma que no resto do mundo, sejam muito sensíveis às mudanças nas
taxas de juros.
Nas últimas décadas as
taxas de juros na Zona do Euro caíram devido a queda da inflação (também da
expectativa de queda da inflação), do crescimento econômico e da mudança na estrutura
demográfica da população. O declínio da taxa de juros reduziu o nível de
cobertura das reservas dos fundos de pensão, ou seja, as obrigações são hoje
bem maiores do que o dinheiro existente para pagá-las. Devido a esses níveis
reduzidos de cobertura das reservas, os benefícios dos fundos de pensão na
Holanda deixaram de ser reajustados pela inflação já faz muitos anos e em
alguns casos, os benefícios foram reduzidos (a legislação de lá determina
isso). Ao mesmo tempo, aumentaram as contribuições para custear os fundos de
pensão.
O impacto nos
participantes e empresas patrocinadoras dos fundos de pensão holandeses,
decorrente desse declínio, tem sido enorme. O valor das obrigações aumentou em
cerca de €100 bilhões. O patrimônio também aumentou – devido aos preços maiores
dos títulos (efeito da marcação a mercado) e ao hedge das taxas de juros – mas, esse aumento foi da ordem de €40
bilhões. Ou seja, os participantes e as patrocinadoras ainda terão que arcar
com aproximadamente €60 bilhões, isso representará um aumento de 20% nas
contribuições, se as taxas de juros continuarem baixas em função da política do
EBC.
Graças a um mecanismo de
suavização previsto na regulamentação de previdência complementar holandesa, a
redução de 47 bps nas taxas de juros apontado
acima não teve efeito imediato, portanto, ainda não foi sentida pelos
participantes dos fundos de pensão. O mecanismo de suavização existe para
evitar as flutuações diárias nas taxas de juros, que acontecem de forma
aleatória devido à volatilidade de curto prazo dos mercados - fundos de pensão
são, por natureza, investidores de longo prazo. Em função dos longos períodos
em que suas obrigações têm que ser pagas, o mecanismo de suavização evita que
os fundos de pensão sofreram os efeitos de curto prazo de políticas de juros
como a estabelecida pelo Banco Central Europeu através da QE.
Não obstante, a QE não é
mais uma questão de curto prazo. Quanto mais tempo perdurar e quanto mais tempo
as taxas de juros permanecerem baixas, mais prejudiciais serão aos poupadores Europeus
de planos de previdência complementar.
Nos próximos três anos os
fundos de pensão holandeses poderão “implodir” se as taxas de juros permanecerem
baixas. Os efeitos da suavização sobre o cálculos dos compromissos, prevista na
regulamentação holandesa, duram 5 anos e terminarão em 2020. A partir daí, caso
as taxas de juros continuem no patamar reduzido de hoje e os fundos de pensão
não atinjam o nível mínimo de capital requerido para cobrir suas obrigações, em
muitos fundos de pensão haverá mais cortes nos benefícios e aumento das
contribuições.
No dia 13 de fevereiro de
2017, o Parlamento Holandês alertou os formuladores de política na Europa para
os efeitos das baixas taxas de juros nos participantes dos fundos de pensão
Europeus. Se persistirem, poderão envenenar lentamente o sistema Europeu de previdência
complementar.
E no Brasil?
O sistema de fundos de
pensão no Brasil é composto por 307 instituições com patrimônio da ordem de R$
800 bilhões, o que representa quase 13% do PIB. Quando fecharam os balanços de
2016, os fundos apuraram um déficit da ordem de R$ 71 bilhões.
Assim como na Holanda, o
déficit do sistema Brasileiro acontece em planos de benefícios definidos. Cerca
de 90% do déficit está concentrado aqui em 10 entidades, a maioria patrocinada
por empresas estatais. Apesar de localizado, o valor é significativo e sempre preocupa
por causa do risco sistêmico que pode causar na imagem dos fundos de pensão
como um todo.
No cálculo de suas
obrigações os fundos Brasileiros utilizam uma taxa de desconto que, simplificando,
é baseada em uma média das taxas de juros de longo prazo definidas pelo Banco
Central nos três anos anteriores ao cálculo.
Essa média existe como
mecanismos de suavização, bem semelhante ao adotado pela Holanda. A única diferença
é que na lá a média cobre um período de 5 anos e no Brasil esse prazo é de 3
anos.
Por isso, a taxa de
desconto utilizada pelos fundos de pensão para apurar as obrigações em 2016
refletiam a política de juros altos que vinha vigorando desde 2013. No apagar
das luzes de 2016 a taxa de juros nominal dos títulos públicos de longo prazo era
de 13,75% ao ano.
Porém, devido a queda
abrupta da inflação e ao baixo crescimento econômico, a política monetária
passou por uma inflexão no início de 2017 e o mais recente boletim Focus do
Banco Central, de abril, aponta previsão média do mercado para Selic nominal de
8,75% em dezembro. Uma queda e tanto! Perto de 40% de redução em apenas 1 ano.
Supondo que a política de
juros baixos do Banco Central do Brasil permaneça nos próximos anos, o impacto
dessa redução só será sentido pelos fundos de pensão em 2020. Da mesma forma
que na Holanda, o efeito será drástico, podendo-se esperar grande impacto no
equilíbrio dos planos de previdência, com déficits maiores e aumento imediato de
contribuições para participantes e empresas patrocinadoras.
Há solução para isso? Sim,
há solução. Vamos tomar um café e eu te conto.
Grande abraço,
ECCS.
Fonte: Adaptado do artigo “PGGM: ECB’s policy could cause Dutch
pension system 'implosion'”, escrito por Agnes Joseph / Niels Kortleve e
publicado em 25/04/2017 na revista Pensions
& Investment Europe.
Crédito de Imagem: Deutschland
Magazine
Marcadores:
Futuro,
Precificação,
Previdência Complementar,
Renda Vitalícia
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Hora no Mundo?
--------------------------------------------------------------------------
Direitos autorais das informações deste blog
A obra Blog do Eder de Eder Carvalhaes da Costa e Silva foi licenciada com uma Licença Creative Commons - Atribuição - Uso Não-Comercial - Obras Derivadas Proibidas 3.0 Não Adaptada.
Com base na obra disponível em nkl2.blogspot.com.
Podem estar disponíveis permissões adicionais ao âmbito desta licença em http://nkl2.blogspot.com/.
Autorizações
As informações publicadas nesse blog estão acessíveis a qualquer usuário, mas não podem ser copiadas, baixadas ou reutilizadas para uso comercial. O uso, reprodução, modificação, distribuição, transmissão, exibição ou mera referência às informações aqui apresentadas para uso não-comercial, porém, sem a devida remissão à fonte e ao autor são proibidos e sujeitas as penalidades legais cabíveis. Autorizações para distribuição dessas informações poderão ser obtidas através de mensagem enviada para "eder@nkl2.com.br".
Código de Conduta
Com relação aos artigos (posts) do blog:
1. O espaço do blog é um espaço aberto a diálogos honestos
2. Artigos poderão ser corrigidos e a correção será marcada de maneira explícita
3. Não se discutirão finanças empresariais, segredos industriais, condições contratuais com parceiros, clientes ou fornecedores
4. Toda informação proveniente de terceiros será fornecida sem infração de direitos autorais e citando as fontes
5. Artigos e respostas deverão ser escritos de maneira respeitosa e cordial
Com relação aos comentários:
1. Comentários serão revisados depois de publicados - moderação a posteriori - no mais curto prazo possível
2. Conflitos de interese devem ser explicitados
3. Comentários devem ser escritos de maneira respeitosa e cordial. Não serão aceitos comentários que sejam spam, não apropriados ao contexto da dicussão, difamatórios, obscenos ou com qualquer violação dos termos de uso do blog
4. Críticas construtivas são bem vindas.
Nenhum comentário:
Postar um comentário