sexta-feira, 3 de abril de 2020

Reuniões virtuais do conselho – O que os fundos de pensão precisam saber



Credito de Imagem: https://www.eldoradoreno.com/venue/meetings/panoramic-boardroom


De São Paulo, SP.

Nas empresas de capital aberto mundo afora, as assembleias virtuais vêm se tornando cada vez mais comuns. Nos EUA em 2019, cerca de 93% das assembleias de acionistas foram virtuais e dessas, 97% das reuniões aconteceram apenas por áudio. 

Essa tendência, no entanto, tem suscitado controvérsia lá fora. Muitos investidores institucionais têm se oposto a essa prática nas empresas em que investem por entenderem que prejudica o engajamento dos acionistas minoritários.

As assembleias de acionistas nas quais são aprovadas anualmente as demonstrações financeiras das empresas de capital aberto, podem ser comparadas às reuniões dos conselhos deliberativos dos fundos de pensão em que o mesmo acontece. 

Para entender melhor o que está em jogo na realização de reuniões virtuais, sejam elas assembleias ou reuniões de conselhos, vamos fazer aqui um paralelo entre os acionistas minoritários de uma empresa de capital aberto e os conselheiros que representam os participantes em um fundo de pensão.

Regulamentação

S/A Capital aberto – a Lei nº 6.4040 (Lei das S.A.), em seu artigo 132 estabelece que as assembleias gerais para tomada de contas dos administradores e aprovação das demonstrações financeiras devem ser realizadas nos quatro primeiros meses após encerrado o exercício social, podendo qualquer acionista participar. 

Tanto a Lei das S.A. como as instruções da CVM permitem que as companhias estruturem meios para realizar suas assembleias gerais ordinárias de forma virtual. O aspecto mais importante, seja numa reunião virtual ou presencial, é assegurar que qualquer acionista tenha a chance de fazer perguntas para os administradores. Em alguns casos as perguntas devem ser submetidas com antecedência, em outros podem ser feitas ao vivo durante a reunião. 

Algumas assembleias misturam participação presencial com virtual na mesma reunião.

Fundos de Pensão – as leis complementares 108 e 109 e respectivas regulamentações estabelecem que os fundos de pensão devem submeter, anualmente, à aprovação do conselho deliberativo, suas demonstrações financeiras. O formato das reuniões do conselho – presencial ou virtual – geralmente está definido no estatuto do fundo ou em regimentos internos do conselho. Não há regulamentação proibindo reuniões virtuais de conselhos de fundos de pensão e eu mesmo já participei de reuniões por vídeo conferência. Por inexistirem regras legais especificas é de suma importância que os conselheiros que representam os participantes tenham oportunidade para expor todas as suas dúvidas e obter esclarecimentos completos.      

Vantagens de reuniões totalmente virtuais

S/A Capital aberto – as reuniões totalmente virtuais podem economizar o dinheiro da empresa, porque custam menos para organizar. Também economizam custos de viagens e deslocamentos dos acionistas e como resultado, tendem a aumentar a participação. O formato de perguntas anônimas encoraja os acionistas a fazerem perguntas mais difíceis para a diretoria e conselho do que fariam em pessoa. Outra vantagem é que as reuniões costumam ser gravadas e mantidas nos arquivos, permitindo que sejam vistas ou ouvidas pelos acionistas que não puderam participar da reunião ao vivo. 

Fundos de Pensão – substitua os acionistas pelos conselheiros que representam os participantes e as vantagens de uma reunião inteiramente virtual serão idênticas. Vale destacar que as gravações das reuniões poderiam até aumentar a transparência dentre os fundos de pensão. Principalmente no caso dos fundos do setor publico federal, como Funpresp-Exe e Funpresp-Jud, de estados e municípios como SPPrevcom, RioPrevidência, ParanáPrevidência e tantos outros. Bastaria disponibilizar a gravação das reuniões de aprovação das contas para TODOS os seus participantes. Essa boa prática de governança já é adotada, por exemplo, pelo CALPERS, o fundo de pensão dos funcionários públicos da Califórnia – EUA, que disponibiliza no Youtube as gravações das reuniões presenciais (Exemplo 1) e virtuais (Exemplo 2 - áudio começa aos 23:36) de seu conselho de administração.

Desvantagens de reuniões totalmente virtuais

S/A Capital aberto – Alguns investidores e vários stakeholders dizem que esse tipo de reunião limita o engajamento dos acionistas porque nelas não há interação pessoal com os executivos da empresa nem com o board. Além disso, existe o temor de que a empresa pince as perguntas dos acionistas evitando questões delicadas e escolhendo as mais convenientes para responder. Outra desvantagem em potencial é que alguns acionistas podem não se sentir confortáveis com o uso da tecnologia necessária para participar das reuniões virtuais. 

Fundos de Pensão – desvantagens idênticas se farão sentir entre os conselheiros que representam os participantes no board de um fundo de pensão. Os conselheiros eleitos entre ativos e assistidos representam entre 1/3 a metade do colegiado. Uma posição minoritária requer plena oportunidade para esclarecimentos e questionamentos. Talvez entre os pontos mais críticos, no caso dos fundos, esteja o acesso a recursos tecnológicos para participação das reuniões virtuais.

Reuniões virtuais nas empresas em que os fundos de pensão investem 

É preciso separar a posição dos fundos de pensão em relação ao assunto. Quando se trata das reuniões de seus próprios conselhos deliberativos, os fundos costumam ser favoráveis ao formato totalmente virtual. Já em seu papel de acionistas, de investidores institucionais, a maioria dos fundos é contraria às assembleias totalmente virtuais por entenderem que limitam a participação e questionamentos.

Fundos como o Calpers e o New York City Pension Fund consideram que as reuniões totalmente virtuais não são um bom substituto para as assembleias presenciais. Os fundos apoiam a incorporação de tecnologia virtual, mas apenas como uma opção e desde que mantida a reunião presencial para os acionistas que assim quiserem. Ou seja, são favoráveis apenas a reuniões híbridas. Posição idêntica é defendida pelo CII - Chartered Insurance Institute um órgão profissional do setor de seguros.

O fundo de pensão da cidade de Nova York se opõe ferozmente as reuniões totalmente virtuais nas empresas em que tem participação, se opondo inclusive a reeleição de todos os conselheiros e membros de comitês de governança das empresas que realizam apenas assembleias virtuais.   

Reuniões híbridas e reuniões totalmente virtuais nos EUA
(Fonte: Morrow Sodali, Lighthouse: 2019 Proxy Season Review, July 2019)


Breve benchmark de melhores práticas em reuniões virtuais

Tomando por base orientações do “Comitê de Melhores Práticas para Participação de Acionistas em Assembléias Virtuais dos EUA (The Best Practices Committee for Shareowner Participation in Virtual Meetings), antes que seu fundo de pensão siga em frente e adote reuniões totalmente virtuais no conselho deliberativo, seria recomendável considerar:

1. A reação dos representantes dos participantes no conselho quanto ao formato que será adotado para a reunião (presencial, totalmente virtual ou híbrida)

2. Se os itens que serão deliberados comportam ou não discussões apenas virtuais

Uma vez decidido incorporar um componente virtual à reunião, a recomendação do comitê é a seguinte:
  • Assegure-se que todos os conselheiros tenham igual acesso para discutir e levantar qualquer preocupação que possam ter;
  • Assegure-se que os conselheiros possam acessar os membros da diretoria virtualmente – seja por vídeo ou apenas por voz;
  • Assegure-se que a tecnologia para acesso remoto seja acessível a todos os conselheiros e que possam contar com suporte técnico se necessário;
  • Solicite feedback apos a reunião para identificar pontos que podem ser melhorados;
  • Crie regras formais de conduta para as reuniões virtuais – tanto para os conselheiros participando da reunião de forma presencial como virtual. As regras devem incluir procedimentos transparentes para colocação das perguntas feitas pessoalmente e virtualmente;
  • Terminada a reunião, arquive a parte virtual para consulta futura.
Que perguntas seu fundo de pensão deveria fazer sobre reuniões virtuais?

Fundos de pensão considerando a realização de reuniões totalmente virtuais deveriam assegurar que a diretoria executiva e o conselho deliberativo estejam alinhados.

Veja algumas questões que os conselhos deveriam se fazer:

  • Nosso estatuto e regimentos internos permitem a realização de reuniões virtuais?
  • Quais são os prós e os contras para nosso fundo de pensão?
  • O que pensam nossos conselheiros que representam os participantes, sobre reuniões totalmente virtuais e reuniões híbridas? Já discutimos com eles esse assunto?
  • Estaremos proporcionando aos nossos conselheiros uma experiência equivalente a uma reunião presencial?
  • Quais serão os protocolos para realização de reuniões totalmente virtuais?
  • Vamos permitir que os conselheiros submetam perguntas por escrito, com antecedência, para serem respondidas durante a reunião?
  • A tecnologia que usaremos está ao alcance de todos os conselheiros? É amigável para uso por não-especialistas em tecnologia? Os conselheiros terão suporte técnico para lidar com eventuais dificuldades e perdas de contato durante a reunião?

Essas recomendações e sugestões são especialmente importantes para as aprovações de contas que acontecerão em 2020. Em função da crise o COVID-19, espera-se que sejam totalmente virtuais quase 100% das reuniões de conselho de empresas e fundos de pensão.

Falei sobre isso no Episódio 2 de Revolucionando os Conselhos, disponível através desse link: Clique aqui


Para concluir, fica uma frase de Winston Churchill que ilustra bem o momento: “Se você estiver passando por um inferno, continue andando”.

Abraço,
Eder.

-->Fonte: Adaptado do do artigo “Virtual shareholder meetings – What boards need to know” elaborado pela PWC (artigo). 

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