De Sāo Paulo, SP.
Ao longo dos últimos anos venho batendo muito na tecla da importância dos fundos de pensão começarem a investir em ativos digitais e se libertarem das amarras que concentram quase 70% de seus patrimônios em títulos públicos.
Por essa mesma razão, não tenho poupado críticas aos tecnocratas da previdência complementar tupiniquim.
Cegos para a nova era da cryptoeconomia, que já chegou, nossos reguladores estāo prejudicando os participantes ao proibirem investimentos diretos e indiretos dos planos de previdência complementar em ativos digitais – achando que ativos digitais se restringem a cryptomoedas, como o bitcoin ...
Esse artigo mostra um exemplo - apenas um, há inúmeros outros - da revolução que a tokenização de ativos reais (físicos) está causando, ao transformar antigas classes de ativos e até permitir o surgimento de novas, gerando incríveis oportunidades de investimento.
O papo de hoje tem a ver com um gigante adormecido de US$ 1 trilhāo e como o blockchain está transformando uma antiga classe de ativos em um instrumento financeiro moderno, sem perder sua alma.
Porque vinhos finos merecem um lugar nos portfolios
Quando a maioria das pessoas pensa em vinho, a ideia que vem a mente são jantares à luz de velas, celebrações familiares e presentes de aniversário para amigos. Poucos pensam imediatamente em “opção de investimento”.
No entanto, é precisamente isso que os vinhos finos têm sido por séculos e a razão de aristocratas britânicos terem, historicamente, construído adegas para estocar parte de suas riquezas.
Foi assim que famílias ricas de Bordeaux construíram fortunas: negociando ativos líquidos que ficam ainda mais valiosos com a idade.
Vinhos finos são uma gigantesca classe de ativos que superou, discretamente, a performance de muitos investimentos tradicionais, embora permanecesse amplamente inacessível à maioria dos investidores.
Alguns números que podem te surpreender: o vinho com “grau de investimento” proporcionou retornos reais médios comparáveis ao ouro, imóveis ou títulos no último século.
Durante momentos de queda dos mercados, mostram baixa correlação com ativos financeiros tradicionais, proporcionando diversificação precisamente quando os investidores mais precisam.
Ainda assim, a despeito dessas características impressionantes, vinho representa apenas uma pequena fração dos portfolios de investimentos – frequentemente, nem é considerado.
Porquê? Porque apesar de sua performance estelar, investir em vinho ainda é algo frustrantemente antiquado.
Paradoxo: ativo líquido, mercado ilíquido
Apesar de literalmente líquido, vinho é um ativo financeiramente ilíquido. Com um mercado global que vale aproximadamente US$ 1,8 trilhōes, incluindo US$ 300 bilhōes investidos em vinhos com grau de investimentos (garrafas que valorizam significativamente ao longo do tempo) você imaginaria uma infraestrutura sofisticada de negociação, semelhante a ações e títulos.
Ao invés disso, é um mercado fragmentado, opaco e ineficiente, com os investidores enfrentando:
Manuseio físico complexo: cada garrafa precisa ser armazenada apropriadamente, com controle de temperatura e humidade. O transporte pode causar dano e gerar custos desnecessários.
Altos custos de transação: negociações no mercado secundário normalmente acarretam taxas de 10% a 25% - imagine pagar isso para vender uma ação – e o tempo de liquidação geralmente se estende por semanas, em vez de segundos.
Preocupação com autenticidade: estima-se que o vinho falsificado represente de 10% a 20% do mercado de vinhos com grau de investimento — o que equivale a até US$ 70 bilhões em garrafas falsificadas circulando globalmente. Para safras raras, a verificação é cara e frequentemente inconclusiva.
Mercado fragmentado: Com +30.000 viniculas e milhões de distribuidores espalhados pelo mundo, o mercado opera em silos geográficos e comerciais. O mesmo vinho pode ser vendido a preços significativamente diferentes em Londres, Hong Kong, Nova York ou São Paulo - simultaneamente.
Acesso limitado: o investimento em vinhos finos tem sido tradicionalmente restrito a indivíduos ricos, com conexões no setor, conhecimento especializado e paciência para lidar com transações demoradas.
Por tudo isso, o vinho fino permanece um gigante adormecido no mundo dos investimentos. Suas características como investimento são atraentes, mas a fricção operacional tem impedido que atinja seu pleno potencial como classe de ativos.
Acordando o gigante adormecido
E se investir em uma caixa de Chateau Lafite 1982 fosse tāo simples como comprar ações da Apple? E se pudéssemos manter o romance que herdamos em torno do vinho, eliminando as barreiras que manem a maioria dos investidores afastada?
A resposta está na tokenização.
Foi isso que levou uma empresa chamada dVin Labs a criar uma solução. Eis o conceito: cada garrafa física é representada por um token digital único no blockchain. Esse token identifica a garrafa e contém informações sobre sua procedência e propriedade (dono). O vinho físico pode permanecer armazenado sob condições ótimas (tipicamente grandes adegas profissionais climatizadas) enquanto o token pode ser transferido instantaneamente entre investidores.
A separação entre propriedade do vinho e custodia física é a principal sacada. Ao tokenizar a garrafa, o vinho em si não são modificados - simplesmente os direitos desse vinho são instantaneamente transferíveis para qualquer ao redor do mundo.
O protocolo criado pela dVin Labs tem três componentes chave: redes de infraestrutura fisica descentralizada (DePin), tokenizaçāo de ativos da vida real (RWA) e monetizaçāo de dados.
Construido na rede de blockchain Solana, o protocolo cria uma Rolha Digital (Digital Cork™) na forma de NFT, representando as garrafas de vinho fisicas, permitindo rastreabilidade da produçāo ao consumo.
O $Vin serve como um token de utilidade nativo (uma especie de cryptomoeda), que facilitando a:
Verificação da cadeia de suprimentos por meio de RFID - Radio Frequency Identification (identificação por radiofrequência) para rastreamento de dados ambientais;
Propriedade fracionada de vinhos de luxo via parceria com plataformas digitais como a SegMint’
Recompensas ao consumidor por compartilhar avaliaçōes sobre a degustaçāo do vinho, permitindo traçar padrōes de consumo; e
Acesso dos produtores de vinho a dados analiticos autenticados sobre o consumo.
As implicações da tokenização do ativo, permitida pela tecnologia do blockchain, são transformadoras:
Liquidez global: uma garrafa tokenizada pode ser negociada 24/7, em nível global, com liquidação da transação em segundos, ao invés de semanas.
Transparência radical: a procedência de cada garrafa, suas condições de armazenamento e histórico de propriedade são registradas simultaneamente no blockchain, eliminando efetivamente o problema de falsificação.
Dramática redução de custos: as taxas de transação nos mercados secundários, hoje entre 10% e 25%, caem para 1%.
Potencial “colaterizaçāo”: proprietários de vinho, incluindo as próprias vinícolas, distribuidores, comerciantes e pessoas físicas, podem usar seu estoque de vinhos finos tokenizados para dar em garantia em empréstimos, destravando capital sem ter que vender seu ativo, que continua valorizando.
Conforme explicou o Co-Fundador da dVin Labs:
“ Nāo estamos tentando causar disruptura ou revolucionar a indústria de vinhos. A última coisa que queremos é acabar com a herança romântica, a produção artesanal e a herança cultural que torna o vinho especial. Ao invés disso, estamos acrescentando uma camada de infraestrutura financeira que cria valor para todo mundo nesse ecossistema”
Criação de valor para todos
A tokenização de ativos do mundo real (RWA – Real World Assets), como fala a comunidade crypto, causara uma colossal transformação no mundo dos investimentos.
Considere, como exemplo, como diferentes stackeholders (partes interessadas) no setor de vinhos finos serão beneficiados com essa tecnologia:
Para os investidores: vinhos tokenizados representam uma nova classe de ativos, bastante atraente, com retornos históricos que rivalizam com mitos investimentos tradicionais, que passam a estar disponíveis com fricção reduzida. Qualuer um pode construir um portfolio diversificado de vinhos finos com gra de investimento, negociar facilmente sua posição diante de mudanças no mercado e ate usar ferramentas analíticas para otimizar a estratégia (ex: Bacchus AI agent)
Para as vinícolas: a tokenização cria novas fontes de receita e eficiência de capital. Os produtores podem receber royalties nas transações feitas no mercado secundário (tipicamente 0,1% do valor da transação) – algo inédito nas vendas tradicionais de vinho. Também podem tokenizar estoques de safras que estāo armazenadas para envelhecimento, para acessar financiamento sem ter que vender as garrafas prematuramente. Podem, ainda, estabelecer relacionamento direto com os clientes através de dados gerados por um sistema de token, na rolha, que indica quando e onde a garrafa foi aberta e consumida.
Para os comerciantes e negociantes: a tokenização permite oferecer aos clientes acesso a vinhos finos (em nível global) sem precisar manter fisicamente as garrafas. Ganham, ainda, 65% das taxas de todas as transações de compra e venda efetuadas por meio de suas plataformas – ao apenas das vendas iniciais, mas de todas as transações futuras desses tokens. Isso transforma uma venda que antes era feita apenas uma vez, em anos de potenciais receitas recorrentes.
Para colecionadores, entusiastas e pessoas físicas: a tokenização melhora a experiencia com o vinho, garantindo autenticidade e fornecendo um registro digital com um histórico da experiencia de degustação. Quando uma garrafa é finalmente aberta e a Rolha Digital (Digital Cork™) é sacada da garrafa, são gerados tokens de degustação (Tasting Tokens™) transmitidos para todos participando da experiencia – criando uma memória digital que pode ser acessada futuramente e ao mesmo tempo, conectando diretamente consumidor e produtor. Quem quiser saber mais pode ler esse artigo: aqui.
Muito além da que tecnologia
Esse mostra como a tokenização vai transformar a maneira como o mundo interage diversas classes de ativos, nesse caso: vinhos.
Os vinhos em si, continuam exatamente o que sempre foram, produtos extraordinários elaborados por enólogos apaixonados, refletindo as condições específicas do terroir onde as uvas são plantadas e a safra, proporcionando prazer a quem eventualmente os abre. Essa é a alma dos vinhos e ela permanece intocada.
O que muda é tudo aquilo em volta do vinho: sua propriedade, como é comprado e venda, rastreado e financiado. O vinho ganha uma nova vida na era digital, tornando-se relevante para jovens investidores e investidores institucionais, alem de mais acessível nos mercados globais.
O timing não poderia ser melhor em um momento no qual cresce o interesse de investidores institucionais (com fundos de pensão) por ativos alternativos e por ativos digitais no blockchain.
Para aqueles que apreciam tanto tradição como inovação, produção artesanal e oportunidade financeiras, a tokenização de vinhos finos torna um ativo com seculos de história equipado para os mercados financeiros do amanhã.
O gigante de US$ 1,8 trilhōes está acordando. A pergunta é: quando nossos tecnocratas de Brasília permitirão que os fundos de pensão façam parte disso?
Grande abraço,
Eder.
Opiniōes: Todas minhas | Fontes: “The $1 Trillion Sleeping Giant: Why Fine Wine Deserves a Place in Your Investment Portfolio”, escrito por David Garrett.
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