sexta-feira, 26 de agosto de 2022

O que representa para os fundos de pensão essa nova era em que o homem-organização é rejeitado e vemos o fim do escritorio como significado de vida?


Credito de Imagem: www.zcool.com


De São Paulo, SP.


Dizem que os escritórios da Apple são incríveis e os benefícios oferecidos aos empregados incluem comida de graça, lavanderia, jogos eletrônicos e um montão de comodidades que tornam o escritório um lugar melhor para os jovens, do que viver num apartamento apertado.

A despeito de tudo isso, os esforços da chefia para trazer os empregados de volta ao escritório estão falhando. Tim Cook, o Chefão da Apple, ordenou que os empregados passem pelo menos três dias por semana no escritório, começando em setembro: terças e quintas são obrigatórias, o terceiro dia vai ser definido posteriormente.

Em um memorando draconiano Cook escreveu que “a interação pessoal é fundamental para nossa cultura”. Em resposta, os empregados disseram, coletivamente: “não, não vai rolar” e começaram a circular um abaixo-assinado contra a decisão unilateral da empresa, dizendo que ela arrisca sufocar a diversidade e o bem-estar dos empregados ao restringir a possibilidade de trabalharem remotamente.

Evidentemente os empregados estão se lixando para a preocupação de Cook em preservar a cultura colaborativa. Eles entendem que a empresa deveria encorajar – não proibir – o trabalho flexível, como forma de construir uma empresa bem-sucedida, que respeita a diversidade de pensamento, onde as pessoas possam se sentir confortáveis em pensar diferente.

“Se você depende do cafezinho para que grandes ideias surjam na sua empresa ... você está fazendo alguma coisa muito, muito errado”, disse Erin Grau – CEO da Charter, uma empresa preocupada com o futuro do trabalho. Pior que ela está certa.

Afinal, o que está acontecendo no mundo corporativo, no mundo do trabalho?

Retomando o controle sobre nossa mente e nossa alma

O que você tem em comum com seus colegas? Há 50 anos essa resposta era fácil, porque o trabalho era linear, as empresas recrutavam pessoas com formação idêntica, para desempenhar tarefas idênticas, produzir resultados semelhantes e previsíveis, sentadas em vastos escritórios.


Num clássico de 1951, o escritor C. Wright Mills assim descreveu a classe média americana:

O novo escritório é racionalizado: usa maquinas, os empregados se tornam operadores das maquinas, o trabalho é coletivo, como nas fabricas, não individualizado, é padronizado para ser intercambiável, com funcionários rapidamente substituíveis, é especializado até o ponto que pode ser automatizado. O grupo de empregados é uma massa uniforme, em um lugar silencioso e o dia em si é regulado por um horário impessoal”.

Para Mills, 70 anos atrás, o “novo” escritório não mudou apenas como as pessoas trabalham, mas mudou também quem as pessoas são. A economia do século passado transformou agricultores e homens de negócio independentes, predominantemente, em “habitantes de escritórios”. Prossegue ele em seu livro:

“O trabalhador do Século XX nunca foi independente como o agricultor costumava ser, nem tão esperançoso do surgimento de uma grande oportunidade, como o homem de negócios. Ele (o trabalhador atual) sempre pertence a alguém, é a co-“porção” de algo (corporação), da empresa, do governo, das forças armadas e é visto como o homem que não ascende (cresce). O declínio do livre empreendedor e o surgimento na cena americana do empregado dependente, tem paralelo com o declínio da independência do indivíduo e o surgimento do trabalhador comum na mente do americano”

Essas mudanças não têm apenas consequências de ordem pratica e psicológica, elas também beiram o espiritual. Os “habitantes dos escritórios” não apenas trabalham para as grandes organizações, eles pertencem a elas.

A organização e sua personificação física, o escritório, é onde as pessoas se conectam umas às outras e encontravam significado. Em outra obra prima dos anos 1950, William H. Whyte chama a atenção para o seguinte:

 “O homem-organização ... é aquele da classe média que sai de casa todo dia, tanto fisicamente como espiritualmente, para se devotar à vida das organizações, são eles que constituem a mente e a alma das grandes instituições que vão se perpetuando a si mesmas”

William White descreve de forma magnifica o mundo corporativo que se seguiu à revolução industrial. Ele via esse desdobramento como uma “Fé Utópica” na qual, em última análise, os trabalhadores se fundem com os seus empregadores e com a sociedade industrial.

O homem-organização de William White, se via “sem sentido, isoladamente”, útil apenas na medida em que “colaborava com os outros”. Ao sublimar a si mesmo no grupo, o homem-organização ajuda a equipe a produzir um todo maior do que a soma de suas partes.

As empresas, corporações e a sociedade mudaram significativamente desde os anos 1950, quando C. Mills e William Whyte escreveram suas obras. A forma que trabalhamos nos escritórios também mudou desde então, se metamorfoseou inúmeras vezes. Ainda assim, para muitos de nós, o escritório permaneceu um ponto focal de nossa vida social e espiritual e nesse sentido, o escritório atual permanece o mesmo.

Preenchendo o vazio social deixado pelo fim do escritório

Até surgir o Covid-19 os empregados passavam a maior parte do tempo no escritório, socializando com os colegas, almoçando juntos, festejando conquistas, celebrando o fim de ano juntos, encorajados a ver a empresa como uma “família”, esperando a cada dia mais que os valores e escolhas da empresa reflitam os seus próprios.

Dezenas de milhões de pessoas passam muito menos tempo no escritório hoje do que costumavam passar antes e alguns o evitam completamente. Isso deixa um vazio social e espiritual nas pessoas. Como preenche-lo?

As evidências apontam para algumas direções. Segundo o Wall Street Journal, clubes fechados, restritos aos membros, estão pipocando por toda Manhattan, servindo como espaço alternativo para interações sociais e trabalho, na medida que os Nova Yorkinos passam cada vez menos tempo nos escritórios.

Diferentemente dos pomposos clubes de elite, a maioria desses novos clubes fechados possuem preços mais acessíveis e visam atrair um grande número de membros com diferentes origens. Tipo a evolução dos espaços de co-work.

Pertencer a um desses clubes “significa nunca mais ter que planejar uma saída à noite, você não precisa fazer nada, apenas aparecer lá”, disse uma mulher, membro de um desses clubes. Um lugar para socializar e fazer networking, onde você é sempre bem-vindo, nunca se sentirá sozinho e sempre será acolhido.


O fim do escritório e os fundos de pensão

David Perrel, que escreve no Twitter, diz estar vendo entre seus amigos uma rejeição apaixonada do individualismo. “O que é velho, passa a ser novo outra vez: a âncora de uma religião, casar cedo, ter filhos logo depois, ter numa comunidade de amigos, a quem você possa ir a pé visitar”.

Essa rejeição do individualismo, que gerou os planos CD e nos afastou do mutualismo dos planos BD, parece ser uma rejeição à vida que o homem-organização vinha tendo até aqui. Uma reação contra a noção de que seu emprego, o escritório ou até a cidade onde você nasceu, são as únicas fontes de significado, de segurança, de propósito de vida.

Com cada vez menos pessoas trabalhando e habitando os escritórios, podemos esperar que mais e mais pessoas abracem novos tipos de comunidade, novas religiões e inventem um ou dois novos tipos de fundo de pensão.

O fim do escritório e do homem-organização, não significa o fim dos fundos de pensão. Significa que precisamos inventar algo novo e diferente se quisermos assegurar nossa segurança financeira no futuro. Mas acima de tudo, significa que precisamos resgatar nossa individualidade, nossa independência social e espiritual do mundo corporativo, relegando ao escritório o lugar secundário que lhe cabe em nossas vidas.

Grande abraço,

Eder.

 


Fontes: God Outside The Office, escrito por Dror Poleg | We’re Going From The Great Resignation To The Great Layoffs, escrito or Jack Kelly | Axios What’s Next, escrito por Joann Muller, Jennifer A. Kingson e Alex Fitzpatrick.

 

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