sexta-feira, 21 de julho de 2023

2020 SERÁ A DÉCADA DA CUSTOMIZAÇĀO DOS INVESTIMENTOS, MAS UM PARODOXO PODE IMPEDIR SUA ADOÇĀO NOS FUNDOS DE PENSĀO





De Sāo Paulo, SP.

Nos anos 50 a General Mills lançou nos EUA uma linha de preparados para fazer bolos sob sua famosa marca Betty Crocker.

O preparado era um mix que continha todos os ingredientes para fazer um bolo, inclusive leite e ovos, tudo em pó. A receita, à prova de erros, economizava tempo e esforço das donas de casa.

Tudo que elas precisavam fazer era acrescentar água, misturar o pó e levar ao fogo. A General Mills pensou ter “descoberto a pólvora” com sua invenção.

Mas o produto não “pegou” e as vendas ficaram muito abaixo do esperado.
A General Mills, então, chamou um grupo de estudiosos de psicologia comportamental para entender o que estava acontecendo.

Os pesquisadores descobriram que os consumidores estavam rejeitando o produto porque ... era fácil demais fazer um bolo com ele, requeria pouco tempo e nenhum esforço.

As donas de casa americanas se sentiam desconfortáveis em usar o produto porque, apesar das vantagens, elas acreditavam estar enganando seus maridos, suas visitas, suas famílias.

O bolo feito com o mix ficava tão bom, que a maioria das pessoas pensava dar muito trabalho prepará-lo, mesmo usando o produto. Então, as mulheres ficavam com a consciência pesada, sentiam estar ganhando mais crédito com o resultado do que acreditavam merecer. 

Vamos dificultar um pouco

Ao invés de partir para uma campanha publicitaria mostrando as maravilhas e vantagens do produto, a General Mills decidiu tornar o produto menos conveniente.

O mix para preparação de bolos foi relançado, mas agora requerendo a adição de dois ovos. Isso criava a percepção de trabalho, propriedade e envolvimento com o resultado final.

O esforço extra ajudou as mulheres a se sentirem menos culpadas sobre a preparação dos bolos, ainda que mesmo assim estivessem economizando um tempão.

O processo de substituir os ovos em pó por ovos de verdade, tornou a preparação dos bolos muito mais significativa e recompensadora, as vendas decolaram.

O produto icônico da General Mills está caminhando para completar 100 anos desde seu lançamento e seu sucesso continua evidente, mas a história poderia ter sido diferente se os ovos em pó não tivessem sido substituídos por ovos reais. 



O viés cognitivo que aumentaria o engajamento nos fundos de pensão

O comportamento humano que salvou o preparado instantâneo para bolos da General Mills foi descrito cerca de sessenta anos mais tarde.

Em 2012 um trabalho de pesquisa conduzido pelo professor Michael Norton e seus colegas da Harvard Business School, descreveu o fenômeno como um viés cognitivo que faz as pessoas valorizarem de forma crescente os produtos auto confeccionados.

Denominado simplesmente de Efeito Ikea - em referência a uma loja Sueca que vende moveis no varejo requerendo que os consumidores os montem em casa por conta própria, tipo a TokStok - o fenômeno acontece quando as pessoas colocam algum esforço pessoal para completar um projeto ou terminar um trabalho. 

Os estudos demonstraram que as pessoas valorizam mais as coisas que elas mesmas criam ou constroem. 



Os consumidores se dispõem a pagar até 5 vezes mais por coisas que eles ajudam a construir, como mostra outra loja americana denominada Build-a-Bear que faz sucesso usando essa abordagem.

A Build-A-Bear (monte seu ursinho de pelúcia) fornece ao cliente uma experiência única. O consumidor entra na loja e compra um ursinho basicão por US$ 15 a US$ 40.

Então, vai passeando pela loja e acrescentando roupa, voz, perfume etc. No final, acaba pagando o dobro, às vezes até mais, pelos acréscimos. 

A Build-A-Bear vende ursinhos caros, mas analisando o modelo de negócio objetivamente, eles oferecem ao consumidor uma experiência única, um ursinho personalizado que cria uma conexão forte entre o comprador e a pessoa que receberá o presente.

A Build-A-Bear vai muito bem, obrigado. Celebrou em 2022 seu 25º ano de existência, o mais lucrativo de toda sua história.

A pessoa que compra um preparado de bolo instantâneo da Betty Crocker, que compra um móvel na Ikea ou um ursinho na Build-a-Bear, é a mesma pessoa que poupa em um plano de previdência individual ou num fundo de pensão.

Evolução dos investimentos nos últimos 70 anos


Desde os anos 50 os investimentos evoluíram mais ou menos assim:

Nos anos 1950: a maioria dos investidores pessoas físicas comprava ações individuais, quase 90% de todas as ordens de compra e venda na NYSE, a bolsa de valores de Nova York, eram executadas por investidores do varejo. Hoje, esse número beira os 5% e os 95% das ordens restantes são executadas por investidores profissionais e investidores institucionais.

Nos anos 1960: nascem os fundos mútuos de investimentos – fundos de ações, fundos de renda fixa – levando os investidores a diversificarem seus investimentos.

Nos anos 1970: os fundos indexados despontam como alternativa de baixo custo levando as massas a investirem no beta do mercado.

Nos anos 1990: surgem os ETF, fundos de índice com cotas negociadas em bolsa de valores, como meio tributariamente mais eficiente para se investir numa variedade de estratégias baseadas em regras especificas (setores, índices, bolsas etc.). 

Nos anos 2010: aparecem os robo-advisors, trazendo maior eficiência operacional e incorporando tecnologia no processo de alocação de ativos e de investimentos baseados em objetivos específicos.

Nos anos 2020: começa uma mudança de paradigma, afastando os investimentos da comoditização em direção a customização (personalização). Essa será a próxima megatendência, o próximo passo a ser dado nos investimentos, possibilitado pelas novas tecnologias.

Estima-se que por volta de 2025 a maioria dos planejadores financeiros estará usando softwares online para criar e administrar perfis de investimentos customizados para seus clientes.

O reino fascinante da customização de perfis de investimentos


Os fundos de investimentos customizados ou fundos personalizados, que em inglês vem sendo chamados de “custom indexing” ou “personalized indexing”, podem transferir para o investidor individual, incluindo os participantes dos fundos de pensão, um grande poder de controle sobre seus investimentos.

Investir em um fundo de investimentos tradicional que acompanha um índice mais amplo do mercado, como fazem os fundos mútuos e os fundos de índices (ETFs), é uma maneira simples e com baixo custo de participar do mercado financeiro.

No entanto, o investidor médio não é capaz de alterar os ativos por trás de um índice – ou seja, os papeis escolhidos por um fundo de investimentos ou um ETF - de forma a refletir seus objetivos e circunstâncias individuais. Isso, até agora.

A indexação customizada, indexação personalizada ou indexação direta, veio para permitir um amplo grau de individualização no mercado financeiro e nos investimentos existentes.

Na indexação tradicional o investidor aplica em um fundo de investimentos passivo que procura acompanhar a performance do índice definido como benchmark, ao invés de superá-la.

A indexação direta, em contraste, envolve comprar a maioria (senão todas) as ações individuais que compõem um índice e então, adicionar ou subtrair ações dele e rebalancear seus componentes, dependendo de seus objetivos de investimentos e seu nível de tributação. Isso lhe fornece maior controle sobre seus investimentos.

Como você pode imaginar, o custo de replicar todas as ações que compõe um índice usado como benchmark – sem falar nas taxas associadas a gestão e custos de transação - são proibitivas para a maioria dos investidores. Por isso, a indexação direta só estava disponível aos megainvestidores. 

Com o advento da corretagem zero, o fracionamento de ações e os avanços na tecnologia tornou-se possível oferecer produtos de indexação direta (fundos customizados ou fundos personalizados) a um custo muito menor. Isso tende a ficar exponencialmente mais fácil e barato com os ativos digitais.
  
A indexação padrão segue uma única metodologia na montagem e gestão do fundo, um conjunto de regras dita quais ativos devem compor o fundo e como ele deve ser rebalanceado.

Na indexação customizada tanto a composição do fundo como a regra de rebalanceamento também são feitas de acordo com uma metodologia definida, só que essa metodologia é personalizada e baseada nas circunstâncias e preferencias do investidor e podem ser ajustadas na medida em que as circunstancias do investidor vão mudando. 


Essa flexibilidade é possível porque a indexação customizada é feita em contas separadas, nas quais o investidor pode ser dono direto de um mix personalizado de ações e títulos de renda fixa individuais, ao invés possuir participação indireta nesses ativos através de um conjunto de quotas de fundos mútuos e ETFs.  

O paradoxo dos fundos de pensão


Os seres humanos não gostam de mudança. Adoramos inovação, mas não mudança. Esse paradoxo, aparentemente irracional, decorre de um conceito poderoso em psicologia: a inércia.

Inércia é a tendencia das pessoas se apegarem aos seus hábito ou comportamentos atuais mesmo quando apresentados com uma alternativa superior.

Apesar de, inevitavelmente, acabarmos nos voltando para a alternativa melhor, inicialmente tendemos a buscar razões para evitar a mudança do status quo. A história está repleta de exemplos de ridicularização e resistência às grandes invenções.


Os fundos de pensão não são uma exceção. Quando surgiram os ETFs nos anos 1990, apesar de suas vantagens sobre os fundos mútuos, que eram mais caros e menos eficientes tributáriamente, os fundos de pensão resistiram ao novo produto que estava desafiando o status quo.

Hoje sabemos que os fundos de pensão reconheceram os méritos dos ETFs sobre os fundos mútuos, pois os fluxos de ativos para cada veículo refletiram essa mudança de sentimento. Foi assim também com os investimentos no exterior e o mesmo está acontecendo com os ativos digitais. 

Estamos agora na iminência de uma nova evolução na gestão de ativos, a transição da era de comoditização dos investimentos em massa via fundos mútuos e ETFs em direção a era da personalização dos investimentos através da indexação direta.

Na medida em que Millenials e Gen Z vão substituindo as antigas gerações como os donos da riqueza, a indexação customizada para fins de EGS e alinhamento com outros propósitos pessoais deverá explodir e adoção. 

Serão os fundos de pensão capazes de descobrir as forças ocultas que direcionam o comportamento dos investidores? Irão eles empregar estratégias de indexação customizada, visando otimizar os perfis de investimentos de seus participantes? Os fundos de pensão darão vida à história pessoal do participante através de seus investimentos?

Ou nāo acrescentarāo dois ovos a receita? Me diz aí, o que você acha!

Grande abraço,
Eder.



Fontes: “How Betty Crocker Became America’s Cake Mix”, publicado em American Food Mart | “The 2020s Will be the Decade of Customization For Financial Advisors”, escrito por Ben Carlson | “The Pros and Cons of Personalized Indexing”, escrito por Nitin BarveJuo-Mao e Mark Liang | “Paradigm Shifts: Commodification to Personalization”, escrito por Jamie Catherwood.


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