De Sāo Paulo, SP.
Se o conselho deliberativo está otimizando o que sabe sobre o funcionamento dos atuais planos de previdência complementar, então seu fundo de pensão está transformando o passado em futuro.
Conselho e diretoria analisam o passado, identificam como o fundo está operando, entendem profundamente seu funcionamento e tentam descobrir um pequeno refinamento, que permitirá fazer aquilo um pouco melhor no futuro.
Esse é o modo dominante nas empresas e nada diferente nos fundos de pensão. Também é o modo dominante na comunidade científica.
No livro The Structure of Scientific Revolutions (em tradução livre seria algo tipo: A Estrutura das Revoluções Cientificas), Thomas Kuhn descreve como “ciência normal” o gentil refinamento do modelo dominante do momento, qualquer que seja o campo no qual o cientista está trabalhando.
De acordo com Kuhn, revoluções cientificas só acontecem infrequentemente porque a vasta maioria dos cientistas dedica seus esforços à ciência normal.
O modo alternativo, o coração das inovações, é a criação de um futuro que não existe agora. Isso é inovação de verdade, mas o caminho é complicado e repleto de erros e falhas – por isso assustador. É a razão dos profissionais em empresas e fundos de pensão focarem em melhorias incrementais e dos cientistas se agarrarem à ciência normal.
O futuro não é um lugar amigável nem receptivo para cientistas nem para profissionais de negócios no mundo moderno. Pior, não existem dados sobre ele – ainda.
Então, as ferramentas de análise de dados no mundo dos negócios e da ciência, não se aplicam prontamente a ele. Para qualquer interessado em inovação, infelizmente, só existem dados relativos a um mundo que não se quer perpetuar e nenhum dado para qualquer outro mundo que se queira criar.
O que fazer? Como podemos ser rigorosos em relação ao futuro de uma forma que nos permita sentir suficientemente confortáveis para avançar em direção a ele de forma inovadora e não apenas de forma incremental?
Fatiando o caminho em direção à inovação
Pense sobre o futuro como fatias finas de tempo. O trabalho dessas fatias finas de tempo é transformar o futuro no passado.
O problema com os próximos seis meses é que não existem dados sobre eles hoje, mas a oportunidade é que no período de seis meses, teremos um monte de dados sobre aquela fatia de tempo.
A tarefa central das inovações bem-sucedidas é gerar dados que sirvam de guia e encorajamento para a tarefa de criar um futuro que não existe agora – um futuro notavelmente superior ao mundo que existe hoje.
Isadore Sharp e a Cadeia de Hotéis e Resorts Four Season
Four Seasons Hotel Istambul em Bosphorus |
No final dos anos 60, Isadore Sharp (o nome é masculino), fundador do Four Seasons Hotels & Resorts, chegou a conclusão que queria redefinir serviço de luxo com sua então nascente cadeia de hotéis que contava com três unidades.
Ele notou que os serviços de hotéis de luxo eram uma combinação de arquitetura e decoração grandiosa com serviços obsequiosos, apesar do alto luxo. Ele havia observado que os hóspedes dos hotéis de luxo, surpreendentemente, não queriam estar lá.
Haviam viajado demais e preferiam estar em casa com as pessoas queridas, senão, em seus escritórios onde poderiam ao menos ser mais produtivos do que num quarto de hotel de luxo trabalhando em uma mesa toda ornamentada, ao invés da mesa familiar de seus escritórios.
A nova abordagem não seria apenas um refinamento do modelo existente, seria um salto gigantesco em relação ao que existia. Sharp não era capaz de reunir dados para provar que o novo modelo funcionaria – porque simplesmente não existiam tais dados.
Não havia como provar antecipadamente que os hospedes de hotéis de luxo seriam atraídos pelo novo modelo, muito menos que estariam dispostos a pagar por ele.
Sharp tinha que criar dados na próxima fatia fina de tempo, o que ele fez construindo um único hotel baseado no novo modelo. O Park Lane, aberto em Londres, era menor, tinha um tamanho mais intimista e contava com o modelo de serviço único que ele havia imaginado.
Como o próprio Sharp diz, se o Park Lane tivesse flopado, seria doloroso, mas não afundaria a cadeia inteira de hotéis Four Seasons. No entanto, teria gerado novos dados – como os hospedes interagiriam com um modelo de negócios inovador. Gostariam da nova abordagem? Pagariam por ela? Seria lucrativo? Sharp foi cuidadoso e ponderado ao criar dados sobre o futuro.
Para a alegria da cadeia Four Seasons, o Park Lane, aberto em 1970, rapidamente se tornou o hotel mais lucrativo da rede Four Seasons e um dos hotéis mais lucrativos do mundo, uma performance que vem perdurando por mais de meio século.
O mais importante, os novos dados que Sharp gerou se tornaram o modelo para todos os futuros hotéis da Four Seasons, o que ajudou a torná-la – de longe – a cadeia de hotéis de luxo mais bem-sucedida do mundo.
O ponto chave para criar uma fatia fina de tempo é ser rigoroso como numa pesquisa cientifica. Sharp criou um experimento real, que gerou novos dados. Definiu antecipadamente o que queria criar, não fez apenas uma coisa para ver o que aconteceria. É preciso haver uma teoria clara que defina e modele o experimento.
Receita para o fundo de pensão interessado
Pesquisas em empresas tendem a estudar os consumidores para saber o que eles preferem, assumindo implicitamente que o mundo vai continuar a ser como ele é hoje, hipótese extremamente improvável.
Ao contrário do que se pensa, a popular abordagem de teste A/B não cria automaticamente o futuro, como muitos proponentes acreditam. A P&G, por exemplo, adota testes de conceito e os utiliza para apresentar uma nova ideia aos consumidores e avaliar seu interesse.
No entanto, eles são notoriamente pouco confiáveis, porque o consumidor diz uma coisa durante o teste e depois, na prática, faz outra. É por isso que seu fundo de pensão precisa imaginar uma possibilidade diferente para formação de poupança e colocá-la em ação. Ao criar um futuro real, pode-se olhar de volta para antes do teste e descobrir o resultado, seja ele consistente ou não com a possibilidade imaginada. Leva algum tempo, requer paciência, determinação e coragem.
A estratégia de trabalhar com fatias finas de tempo vem de uma abordagem chamada Rapid Iterative Prototyping ou Prototipagem Iterativa Rápida. Essencialmente, essa abordagem divide o futuro em múltiplas fatias finas de tempo e usa cada fatia para avançar no entendimento da solução idealizada. Considera que a primeira interação da sua teoria não será muito profunda – mas pode colocá-lo na direção certa. Se você constrói a solução seguindo naquela direção, a cada fatia do futuro você constrói um modelo melhor. É um processo incremental para criar confiança, mudar o status quo e fazer algo realmente novo. É a melhor abordagem no mundo dos negócios para inventar o futuro (mais nesse artigo da Harvard Business Review: aqui) .
Disruptura e inovação na previdência complementar é difícil. Você pode ter certeza de que as pessoas ao seu redor tentarão desencorajá-lo. Seu conselho pedirá que você prove que qualquer inovação funcionará, antes de aprová-la e você simplesmente não conseguirá fazer isso.
Mas quem disse que é fácil?
Grande abraço,
Eder.
Fonte: “Transformado o futuro no passado”, escrito por Roger Martin
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