sexta-feira, 30 de junho de 2023

A LEI DE LESLIE E OS FUNDOS DE PENSĀO

 

Crédito de Imagem: www.explorecourses.stanford.edu


"AS COISAS GRANDES, GERALMENTE, COMEÇAM PEQUENAS" - (Autor desconhecido)

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De Sāo Paulo, SP.


Por décadas foi inconcebível que qualquer um pudesse competir com a dominância absoluta da IBM na indústria de computação.

A IBM tinha 65% do mercado e o restante era dividido pelo que, na época, eles chamavam de “RESTO”: empresas como Burroughs, Univac, NCR, Control Data e Honeywell. Cada uma delas tinha seu próprio hardware e software proprietário e todas eram pesadas, tolas e felizes.

Tão felizes que nem piscaram quando, em 1959, uma empresa chamada Digital Equipment desenvolveu e lançou no mercado o PDP-1, uma nova abordagem de minicomputadores com memória padrão de 4K, palavras de 18 bits e clock (velocidade) de 200K. Configurações consideradas triviais comparadas aos grandes mainframes da IBM.

Porém, 30 anos depois, as vendas da Digital Equipment somavam US$ 14 bilhões e uma nova indústria de computadores havia surgido, alimentando empresas tipo HP, Data General, Prime, Varian e um montão de outras.

Coincidindo com a guinada da indústria de hardware, o sistema operacional UNIX, desenvolvido pela AT&T no final dos anos 1960, entrou no jogo, papando ainda mais a dominância da IBM e abrindo as portas para sistemas de computação baseados em microprocessadores, como o Sun Microsystem, que se tornou a principal plataforma de computação nos anos 90.

Lá pelo final da década essas empresas haviam desbancado o “Rei IBM” de seu trono, relegando-o ao decrescente – mas ainda lucrativo – negócio de mainframes.

Durante metade do Século XX era impossível não encontrar um artigo sobre  TI ou falando da indústria de computação, que não mencionasse a IBM. Hoje em dia dificilmente se acha sequer um artigo sobre a IBM – exceto para descrever sua decadência.

A Lei de Leslie


Mark Leslie (esse da foto aí de cima) é Professor da Stanford Graduate School of Business, onde ensina Empreendedorismo, Ética e Organização de Vendas.

Foi ele quem cunhou a “Lei de Leslie” que tem a ver com um ciclo em tecnologia: soluções pequenas, simples e baratas suplantando as grandes, complexas e caras.

Eventualmente, inevitavelmente, esses pequenos entrantes vão abrindo caminho na cadeia alimentar do mercado, capturando fatias cada vez maiores, até que os mastodontes são “escanteados” num nicho cada vez menor do segmento.

Quando você começa a olhar o mundo sob essa lente – mostrando que quando o pequeno encontra o grande, o pequeno sempre vence – você nota que isso acontece por todo lado, em todos os setores.

Crédito de Imagem: www.englishforbrazilianpeople.com

Geralmente quando um player pequeno e esquivo entra no mercado, ele faz isso criando pouca fricção, através de um produto com alta aderência, bem-acabado, vendido por preço baixo em um grande mercado.

Os novos produtos são vendidos para uma parcela do mercado que não tem acesso aos produtos vendidos pelos grandes players devido ao custo (em dinheiro e complexidade) do produto de entrada. A empresa grande geralmente nem nota que as pequenas entraram no mercado porque não há confronto direto, mano-a-mano, com seus produtos.

Isso deixa a empresa pequena livre para se expandir. A necessidade dos clientes da pequena empresa vai aumentando e ela tem interesse em se expandir em direção ao topo do mercado. Isso a faz melhorar as características e funcionalidades do seu produto.

Sob a perspectiva das grandes empresas incumbentes, essa migração da pequena em sua direção é imperceptível. Elas não estão preocupadas, não prestam atenção, mas está acontecendo.

A reação típica das grandes empresas incumbentes do mercado é um misto de negação, "Dilema do Inovador" e um desdém arrogante.

Inevitavelmente, quando a ameaça se torna visivel, é tarde demais. A empresa pequena criou raízes, desenvolveu-se com a vantagem de uma estrutura de baixo custo, com um produto simples e de baixa fricção.

Um novo ecossistema foi criado em torno das principais ofertas da empresa menor. Ela veio para ficar e suas incursões no território do incumbente não podem mais ser detidas.

Fundos de Pensão e a Lei de Leslie


Qual a lição aqui?

Na medida em que entramos numa era em que as soluções vão sendo “desempacotadas”, o que antes era um segmento principal de atividades atendido por uma ou outra grande empresa, passa a ser atendido melhor e mais eficientemente por várias empresas menores e isoladas.

A P&G, por exemplo, reinava sozinha no seu setor e hoje tem que competir de modo pulverizado, com empresas como a Harry’s focada apenas em lâminas de barbear de baixo custo, com a Walker & Co que foca em nichos de cosméticos e assim por diante.

Agora mesmo estamos vendo a proliferação de inúmeras pequenas fintechs, algumas focadas apenas no negócio de credito, outras de meio de pagamentos, outras de investimentos em renda variável, atacando a dominância de bancos médios e grandes acima delas que oferecem tudo isso junto.

A aplicação da Lei de Leslie ao segmento dos fundos de pensão, que se concentra em atender unicamente as necessidades básicas de poupança de longo prazo das pessoas, daqui a poucos anos, vai tornar os planos de previdência complementar muito diferentes do que são hoje.

Da mesma forma que acontece com os pequenos players que competem com os bancos, surgirāo soluções isoladas competindo com o segmento de previdencia complementar focadas em poupança para diferentes horizontes de tempo, focadas em empréstimos etc.

Se o seu objetivo é causar disruptura nesse setor, você deveria criar uma solução legal para caramba e sem fricção para a parte inferior do mercado.

Deveria criar um produto que solucione um problema importante de segurança financeira de curto, médio e longo prazos para uma parcela do mercado que hoje é mal atendida ou não-atendida, nem pelos fundos de pensão, nem pelas grandes organizações de previdência incumbentes.

Soluções voltadas, tipo, para pessoas que trabalham na economia informal, para a tiazinha que vende café ali na esquina, para os empregados autônomos, os pequenos negócios (cabeleireiros, mercadinhos, cafeterias ...) e por aí vai.

Uma vez que você atinja excelente tração com seu produto, estará em posição de escalar os andares de cima e competir com os pesos pesados do setor.

Você sempre terá a tentação de sofisticar excessivamente seu produto, de gritar e fazer barulho no mercado com sua solução, porque sua estrutura é pequena, barata e seu produto bom e criativo.

Resista a este impulso - voar abaixo do radar é sua verdadeira vantagem competitiva - e mantenha sempre um olho na retaguarda, para enxergar o próximo pequeno competidor que vem chegando e pretende, um dia, papar a sua participação de mercado.
__________________


Entre 2010 e 2020 eu era alto executivo no setor de previdência complementar, sentado na primeira fila, observei o desmantelamento de empresas globais de consultoria de riscos atuariais, fundos de pensão e tantas outras mudanças dramáticas no setor.

Uma atrás da outra, vi grandes firmas de assessoria e fundos de pensão, considerados gigantes, sendo engolidos e desaparecendo diante de grandes players complacentes do setor, um processo que se ainda se encontra em andamento.

Alguns analistas dizem que ao fim desse processo, restarão uns poucos grandes players no mercado de fundos de pensão. Se Mark Leslie estiver certo veremos, sim, uns poucos grandes players no mercado de soluções em torno da segurança financeira dos consumidores, mas não serāo nada parecidos, nem se chamarāo fundos de pensão …

Grande abraço,

Eder.




Fonte: “Leslie’s Law: When Small Meets Large, Small (Almost) Always Wins”, escrito por Mark Leslie



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