De Sāo Paulo, SP.
A definição de “affordance” foi originalmente proposta pelo psicólogo James Gibson em 1977 para denotar a qualidade de qualquer objeto que permite ao indivíduo identificar suas funcionalidades através de seus atributos - forma, tamanho ou peso - de maneira intuitiva e sem explicações.
A tradução mais próxima para o português seria “design de interação”, definido como: o desenho de produtos e serviços no qual o foco vai além do item em desenvolvimento, leva em consideração a maneira como os usuários vão interagir, indo mais a fundo e além do design “tradicional”.
Quando você vê um produto bem desenhado no dia a dia, o design de interação que você percebe deve indicar como usá-lo. Você não deveria ter que se esforçar para descobrir como funciona seu chuveiro se quiser tomar um banho, não deveria ter que se basear em tentativa & erro ou ter que se molhar com água fria no processo.
O desenho de uma coisa comum deveria deixar evidente a forma de usá-la. Um objeto deveria comunicar isso através de seu design de interação.
Um botão embutido permite pressioná-lo. Um mostrador saliente permite girá-lo. Uma chave seletora permite alternar. Você pode jogar uma maçã para outra pessoa pegar, uma bigorna não. Uma cadeira com encosto permite sentar-se e encostar-se, um banquete ou um puff só permitem sentar-se.
Don Norman, que popularizou o termo “affordance” ou design de interação através de seu livro clássico “The Design of Evereday Thing”, que em tradução livre seria algo como: O Desenho das Coisas do Dia a Dia, fala bastante sobre portas.
Podemos empurrar ou puxar uma porta ou ainda, deslizá-la para o lado. Algumas vezes as portas abrem para cima, mas raramente para baixo. Sendo algo tão fundamental para nosso dia a dia, você poderia pensar que acertamos os desenhos suficientemente para não as usarmos da forma errada.
No entanto, sou capaz de apostar que você já puxou uma porta, quando deveria empurrá-la, porque colocaram uma barra dando a impressão que era para abrir puxando. Frequentemente, uma porta desenhada dessa forma ganha um aviso indicando “empurre”. Don Norman diz que se seu desenho precisa explicação ou um aviso, considere outro desenho.
Credito de Imagem: Sketchplanation
As frustrações apontadas por Dan Norman referem-se principalmente aos desenhos de coisas do nosso cotidiano. Se você for um controlador de tráfego aéreo ou um astronauta é razoável se esperar algum treinamento para você poder usar as funcionalidades avançadas dos dispositivos.
Mesmo assim, em ambientes especializados como de saúde, bons desenhos – como evitar armazenar remédios por ordem alfabética – são críticos para reduzir o potencial de erros.
Nos planos de previdência complementar oferecidos pelos fundos de pensão a importância do desenho, mas também do seu uso pelos participantes, é crucial para se atingir os objetivos de longo prazo. Não obstante, essa é uma questão frequentemente desprezada.
Aplicaçāo prática de design de interação
O Prof. Itamar Simonson, da Stanford, levou alguns “snacks” para sua aula semanal e os ofereceu aos alunos. Não porque ele estava querendo ser legal, mas porque faziam parte de um estudo.
De acordo com o professor, algumas vezes não queremos fazer escolhas, pelo menos não uma nova escolha. Assim que escolhemos uma opção, nos agarramos a ela se tivermos que fazer a mesma escolha novamente.
No estudo, o Prof. Simonson ofereceu a uma de suas duas classes a possibilidade de escolherem um snack toda semana. A outra classe tinha que escolher, na primeira aula, o snack para o período de três semanas seguintes.
Ele descobriu que as pessoas que fazem escolhas intertemporais, ou seja, uma escolha para um ponto no futuro, tem preferências diferentes das pessoas que fazem uma série de decisões mais imediatas.
Os alunos que tinham que fazer escolhas para as três aulas seguintes, selecionavam mais variedade de snacks do que aqueles que escolhiam o snack apenas para a próxima aula.
Credito de Imagem: Plastik Embalagens
Por exemplo, alguém escolhendo para o período de três semanas poderia pegar batata chips, castanha e barrinha de cereais. Já alguém tendo que decidir toda semana escolhia a barrinha de cereais, a barrinha de cereais, a barrinha de cereais.
As pessoas fazem isso o tempo todo. Você seleciona alguns filmes diferentes no Netflix para assistir quando tiver tempo, aí quando você finalmente senta para assistir algo, você escolhe na hora um filme que está passando no momento.
Eu mesmo tenho um bom exemplo disso. Costumo comprar livros sensacionais, que pretendo ler mais adiante, assim que tiver tempo e os guardo na estante da biblioteca de casa. Sempre que passo pela biblioteca, lá estão os livros ainda envoltos pela película plástica protetora, esperando para (um dia) serem lidos ...
A implicação prática da descoberta do Prof. Simonson é que se alguém pede para você fazer escolhas imediatas versus tomar decisões de longo prazo, pode-se esperar que você se comporte de modo diferente.
Essa diferença de comportamento pode ter implicações importantes e em certas situações, prejudiciais para participantes de planos de previdência complementar.
É muito bom poder escolher entre diferentes percentuais do salário para contribuir ao plano de previdência da sua empresa. No entanto, se você escolhe um percentual mais baixo quando entra no plano e nunca mais o altera, vai acumular uma poupança para a aposentadoria menor do que a necessária.
Por exemplo, digamos que as opções de contribuição sejam o valor equivalente a 2%, 5%, 7% ou 9% do salário. Quando entra no plano, o participante precisa escolher um percentual, que pode mudar anualmente se quiser.
Vamos supor que ele escolha 5%. De acordo com o estudo do Prof. Simonson, o participante vai escolher 5% e dificilmente vai alterá-lo posteriormente.
Então, ao invés de se pedir ao participante para escolher um único percentual de contribuição ao aderir ao plano, digamos que o regulamento determine que ele precisa escolher, na partida, os percentuais de contribuição dos três primeiros anos.
Como o estudo diz que se você tiver que fazer escolhas para o futuro, você tenderá a buscar mais variedade nas suas preferências, pode-se esperar que o participante que escolhe 5% ao aderir ao plano, venha a escolher naquele mesmo momento um percentual maior (7% ou 9%) para os anos seguintes.
Considerando que o participante pode alterar o percentual todo ano, tanto a escolha do percentual apenas do primeiro ano, quanto a escolha (na adesão) dos percentuais dos três primeiros anos, seriam neutras, isto é, não trariam prejuízo nenhum para os participantes.
Outra implicação do estudo é que se pode antecipar um provável comportamento.
Suponha que, no final do ano, seu fundo de pensão queira incentivar os participantes a fazer contribuições adicionais, em função do benefício tributário.
Não é muito inspirador pedir a um participante que está focado em presentes de Natal e festas de fim de ano, que faça contribuições além daquelas que ele já vem fazendo ao plano. Como substituir as gratificações imediatas de fim de ano pelo impulso de poupar mais dinheiro no plano, cuja gratificação será apenas no futuro?
Você pode fazer algumas coisas para aumentar o impulso do participante fazer contribuições adicionais. Existem programas de fidelidade que exigem uma compra para você poder aderir, mas te presenteiam com um brinde quando você se inscreve neles. Por que não pensar num brinde simples e de baixo custo para quem fizer contribuições adicionais? Tipo um vale presente de R$10, lembrando que o importante é a percepção de gratificação imediata e não o valor dela.
Credito de Imagem: JoiasUseZoe
Também pode-se conjugar à estratégia acima, o viés da “aversão a perda”. A ideia de que é muito mais forte a sensação que as pessoas têm quando perdem alguma coisa, do que a satisfação que sentem quando ganham algo.
Poderia se criar a sensação de urgência impondo-se uma data limite para se fazer as contribuições adicionais que dão direito ao brinde, após a qual o brinde não estaria mais disponível. As pessoas tenderiam a agir rapidamente para não perder a oportunidade.
Os fundos de pensão têm vários meios pelos quais podem ajudar seus participantes a ter um futuro melhor, auxiliando-os a fazerem melhores escolhas hoje e facilitando e/ou recompensando suas decisões de longo prazo.
Qual o propósito do seu fundo de pensão?
A responsabilidade em assegurar que um participante tenha um futuro financeiramente mais seguro, não termina no momento em que ele é convencido a aderir a um plano de previdência complementar.
O verdadeiro sucesso depende do que o fundo de pensão vai fazer depois, para informar e influenciar o participante ao longo de sua jornada, fazendo-o poupar o suficiente para ter um futuro tranquilo.
Os fundos de pensão têm responsabilidade moral e social em assegurar isso. O que vai determinar se um fundo de pensão será bem-sucedido é o grau de preocupação que ele tem em fazer a coisa certa, seu grau de humanidade e o quanto ele se importa verdadeiramente com as pessoas.
Grande abraço,
Eder.
Fonte: “Customers Really Don't Want Choice and What to Do About It”, escrito por Colin Shaw | “Affordance”, escrito por Jono Hey.
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