De São Paulo, SP.
Usar sua voz para influenciar os outros pode ser algo poderoso quando se trata de divulgar valores no mundo corporativo.
As empresas geralmente exercem grande influência sobre seus clientes, empregados, fornecedores e competidores. Os fundos de pensão, então, nem se fala, contam com uma fidelidade quase absoluta de seus participantes.
Com tamanha influência, vem a responsabilidade de falar sobre coisas que importam, na hora de distribuir recursos, ao divulgar ideias e fornecer apoios.
Essa responsabilidade, no entanto, é uma faca de dois gumes.
O lema de Emmeline Pankhurst, nascida em Manchester em 1858, uma das fundadoras do movimento britânico do sufragismo – a luta pelo direito de voto das mulheres no período imediatamente anterior a primeira guerra mundial – era:
Atos e não palavras
Mais de um século depois, departamentos de marketing, conselhos de administração e conselhos deliberativos mundo afora ainda não entenderam esse conceito.
Se não agirem, de forma autêntica, para dar sustentação à imagem que divulgam em suas campanhas de marketing e nas comunicações internas para os empregados, essa imagem terá pouca influência para suas marcas e pior, poderá ser um tiro pela culatra.
Cerca de 88% dos consumidores querem que as marcas que compram sejam éticas, portanto, nunca foi tão importante para os negócios mostrar a ética em sua missão.
Whoke e woke-wahing
O termo greenwashing foi cunhado em 1986 pelo ativista ambiental Jay Westerveld num artigo apontando a hipocrisia da indústria hoteleira que promovia falsamente a ideia de que a reutilização das toalhas era parte de uma estratégia de preservação ambiental, quando na verdade era adotada como medida de economia.
O termo cresceu em popularidade nos EUA a ponto de hoje constar no Oxford, dicionário da língua inglesa, que define greenwashing como:
“A disseminação de desinformação por uma organização de tal forma que apresente uma imagem pública de responsabilidade ambiental”
A partir daí foram surgindo inúmeros outros termos: pink-washing para se referir à falsa preocupação com orientação sexual, purpose-washing para hipocrisia nos propósitos corporativos, social-washing para incoerência em questões sociais, governance-washing para atuação ruim dos conselhos e por aí vai.
Hoje em dia tem se usado o termo woke-washing meio que para condensar todas essas práticas. Woke em inglês significa “acordei”, ganhou conotação de gíria para indicar com quais posturas políticas você se identifica.
Acredita-se ter sido o romancista William Melvin Kelley (1937-2017) que popularizou esse uso ao escrever em 1962 um artigo no New York Times intitulado “If You’re Woke, You Dig it”, em tradução livre seria algo tipo “Se Você estiver acordado, Você Manjou”.
No começo de 2014 o termo ressurgiu na comunidade negra através do movimento Black Lives Matter, para denunciar a brutalidade policial contra afrodescendentes.
O uso se espalhou passando a ser usado com significado mais amplo, como alerta para injustiça social. Em 2017 o dicionário Oxford inclui o termo woke com significado de “estar consciente sobre temas sociais e políticos, especialmente racismo”.
O contraponto ganhou proeminência com gafes de alto nível cometidas recentemente por grandes empresas multinacionais.
Tipo o controvertido comercial da Pepsi (vídeo abaixo) com a modelo Kendall Jenner, baseado nos protestos do Black Lives Matter, que acabou sendo acusado de banalizar a morte de negros pela policia.
Também foi o caso da campanha Dream Crazier da Nike, criticando as más atitudes contra mulheres, cujo comercial (vídeo abaixo) com a Serena Willians, mostrava mulheres atletas fazendo o que se pensava impossível.
Enquanto isso, a atleta de corrida Alysia Montaño, patrocinada pela própria Nike, ganhava uma ação na justiça contra a empresa por não conceder licença maternidade remunerada.
Acordado com ESG, mas dormindo com a gestão de riscos
O Silicon Valley Bank contratou um conselho obcecado por diversidade, anunciou investimentos de US$ 5 bilhões até 2027 em iniciativas em prol de um “planeta melhor”, conduziu celebrações do Pride (orgulho gay) duraram um mês inteiro, mas ... ficou SEM um CRO - Chief Risk Officer (Diretor de Riscos) por oito meses.
Com um rating “A” pelo MSCI Index por suas políticas em questões ambientais, sociais e de governança (ESG), focando em startups voltadas para sustentabilidade, o SVB investia o $$$ dos clientes em títulos públicos do governo americano com baixas taxas de juros, que perderam valor com a alta dos juros pelo FED.
Os executivos do SVB se preocupavam com iniciativas woke, conceito mencionado acima, mas falharam ao não prestar atenção aos problemas gritantes com os investimentos na medida que a taxa de juros subia.
Em seu Relatório Anual de 2022 o banco se jactava em estar criando um mundo mais justo, equitativo e sustentável.
“Nosso compromisso com Investimentos Sustentáveis visa dar apoio a empresas trabalhando para descarbonizar a energia e a infraestrutura e acelerar a transição para uma economia sustentável, de baixo carbono, com emissões zero”, dizia o relatório.
Mencionava, também, a política de diversidade, igualdade e inclusão para cargos de liderança em suas operações nos EUA, que pela primeira vez se preocupou com seis grupos de empregados: asiáticos, negros, hispânicos, LGBTQ+, veteranos (das guerras), militares e gênero feminino.
Quando o banco colapsou na sexta passada, seu board contava com 1 negro, 1 LGBTQ+ e 2 veteranos. No board havia figuras como Mary J. Miller, ex-secretária adjunta de economia doméstica, do departamento do tesouro americano.
O CEO do banco, Greg Becker, era visto frequentemente pedalando sua bicicleta pelo bairro onde morava e disse durante um encontro com investidores na semana passada que isso o ajudava a se desestressar.
Enquanto tudo isso acontecia, o banco estava sem um diretor responsável pela gestão de risco. Laura Izurieta, ex-CRO do Capital One e Head de Riscos do SVB, deixou o banco em abril de 2022. Ela não foi substituída até janeiro de 2023, quando o banco contratou Kim Olson do Sumitomo Mitsui (um banco japonês).
“Os administradores ferraram o passo com as taxas de juros, subestimaram os saques dos clientes, contrataram as pessoas erradas e não conseguiram vender patrimônio”, escreveu Andy Kessler para o Journal.
Num comunicado para o DailyMail.com, Will Hild – Diretor Executivo de Pesquisa com Clientes, declarou: “É poético que o SVB seja o primeiro banco a quebrar por “ter acordado” (going woke), seguindo a cultura de negócios que vigora no Vale do Silício, notoriamente de extrema esquerda e fora de compasso com o resto do país”.
“Que sirva de alerta não apenas para os outros bancos, mas para todo o mundo corporativo da América: Foquem em servir seus consumidores, não em politicagem tipo woke”, completou ele.
O candidato republicano a presidência, Vivek Ramaswamy, escreveu em carta aberta que “o SVB decidiu intencionalmente não fazer hedge de seu risco da taxa de juros. Das duas uma: ou o SVB foi incompetente ou esse é um caso de risco moral (moral hazard) em que tomou risco excessivo esperando favores políticos e socorro do governo”.
“Como dizem os empreendedores do Vale do Silício, o importante é se mover rápido e quebrar as coisas (move fast and break things), mas não devemos deixar que eles quebrem a confiança publica enquanto fazem manobras esperando por socorro. Não é assim que o capitalismo funciona”, completou Ramaswamy.
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O estrago corrosivo do woke-washing foi apontado pelo CEO da Unilever, Alan Jope, que disse: “está colocando em perigo a oportunidade que temos de ajudar a atacar muitos problemas do mundo”.
Mais direto ainda foi JP Hanson, CEO da Houser – uma agência de marketing Suíça, que teria dito numa entrevista ao jornal britânico The Guardian: “se você começar a pagar, desculpe o meu francês – a porra dos impostos, então você pode fazer outras coisas".
JP Hanson se referia ao Starbucks, que prega sobre “comunidades” em suas propagandas e não paga os impostos, que ajudam a construir as comunidades, escolas e hospitais.
Quem sabe o SVB tivesse mais tempo para se preocupar com aquilo que realmente importa na gestão de terceiros - que é a busca de segurança financeira para seus clientes - se ao invés de concentrar seus esforços em iniciativas de WOKE, tivesse cuidado da p*#$$@ da gestão de riscos de seus investimentos ....
Fica a dica!
Grande abraço,
Eder.
Fontes: The dirty truth about purpose-washing, Impactful | O que é 'woke' e por que o termo gera uma batalha cultural e política nos EUA, BBC News Brasil | Go woke go broke!, escrito por Melissa Koening.
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