Resposta: Governança
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De São Paulo, SP.
O colapso recente de três grandes instituições financeiras, duas nos EUA e uma na Europa, mostra a importância de uma das três pernas de ESG: o “G” de Governança.
Também levanta a questão do porquê as maiores firmas de classificação de riscos, que produzem ratings para os fatores ESG – questões ambientais, sociais e de governança, falharam ao não identificar e acender a luz vermelha na avaliação de riscos da governança dos bancos que ficaram insolventes.
Antes de quebrar, o SVB - Silicon Valley Bank (ticker: SIVB) tinha rating “A” e avaliação média, dada pelo MSCI, a maior firma de rating de fatores ESG. Avaliação média, de acordo com a descrição do website do MSCI, significa que a empresa avaliada é:
Uma empresa com um “track record” (histórico) misto ou excepcional em relação às demais empresas do seu setor, na gestão dos riscos e oportunidades ESG considerados mais significativos
A Moningstar Sustainalytics, outra grande firma que avalia as empresas em relação aos fatores ESG, avaliou o SVB como tendo “médio risco”, com um score controverso de 1 ou menos.
Todos esses ratings foram dados mesmo o SVB tendo passado a maior parte do ano de 2022 sem um Chief Risk Officer e contando com investimentos problemáticos em títulos hipotecários e papéis do tesouro americano.
O Comitê de Riscos do SVB era formado por pessoas com pouca ou nenhuma experiência na administração de bancos. O único membro com experiência anterior no setor era Thomas King – Ex-CEO da divisão de investimentos do Barclays, que havia se juntado ao board do SVB em setembro de 2022, seis meses antes do banco quebrar.
Aliás, esse parece ser um problema recorrente já que o Presidente do Comitê de Riscos do Lehman Brothers, quando o banco faliu em 2008, era um membro independente sem experiência prévia no setor financeiro, ele era CEO de ... um museu.
Está mais do que na cara que o problema com os ratings ESG é que eles não levam em conta as pessoas, processos e sistema que compreendem o fator “G”, diz Matt Moscardi, fundador da Board Sabermetrics, uma firma que avalia conselhos.
“O que está faltando nos ratings é avaliar se as pessoas responsáveis pela governança são boas no que fazem, se têm influência excessiva e qual seu desempenho”, pondera Moscardi, que trabalhou quase uma década na MSCI e ajudou a desenvolver o modelo de rating dos fatores ESG.
A falha das firmas que produzem rating de ESG, ao não identificarem os riscos de governança dos bancos, mostra que os scores não reúnem informações que possam ser consideradas confiáveis.
Os maiores investidores não se baseiam nesses scores, eles conduzem suas próprias pesquisas e análises e às vezes usam scores de terceiros para identificar anomalias que devam investigar mais a fundo.
Shivaram Rajgopal - Professor de Auditoria e Contabilidade da Columbia Business School escreveu num artigo recente que “os controles internos e externos falharam tão espetacularmente em detectar a péssima gestão, que ninguém pode esperar muita coisa do establishment que conduz ratings de ESG.
Ainda assim, os ratings de ESG são extensivamente usados por empresas, fundos de pensão e fundos de investimentos para fazer marketing de si mesmos.
Essa controvérsia toda mostra que mesmo as organizações que possuem avançadas práticas de governança no papel, não estão imunes a problemas significativos.
Mostra, também, a necessidade de se avaliar os riscos específicos decorrentes da qualidade de gestão, aos quais as organizações estão sujeitos.
Eu costumo dizer que o “G” está no centro de tudo e deveria ser inclusive a primeira letra do acrônimo, tipo GES ao invés de ESG, porque é a Governança que vai determinar como a organização vai tratar do E (questões ambientais) e do S (questões sociais).
Estamos prestes a entrar na terceira onda de renascimento da governança, a Enron levou à primeira onda e o Lehman Brothers et all à segunda.
Como limitar perdas nos investimentos dos fundos de pensão
A diversificação dos investimentos e o acompanhamento de perto dos riscos decorrentes das operações do Credit Suisse, ajudaram os fundos de pensão suíços a conter as perdas decorrentes do quase colapso do banco, salvo da quebra pelo USB.
O maior fundo de pensão da Suíça, o Publica, passou a prestar particular atenção às atividades do Credit Suisse nos últimos anos, após seu envolvimento em vários escândalos.
Em 2021 o Comitê de Investimentos do fundo de pensão começou a conversar com o banco sobre a “melhoria de sua cultura corporativa”. Foram feitas duas reuniões em 2022 com a alta gerência e uma terceira estava agendada para maio de 2023. Não deu tempo.
O Publica vem se recusando a aprovar as decisões do board do Credit Suisse, em todas as assembleias anuais de acionistas desde 2016.
Outro fundo de pensão, o BVK, patrocinado pelo cantão suíço (equivalente aos estados no Brasil) de Zurich, diversifica seu portfólio investindo em mais de 5.000 empresas. Sua política de investimentos estabelece o limite de 4% para investimento em ações de empresas suíças e no final de 2022 o BVK tinha pouco menos de 4% de seu patrimônio investido nessa categoria. Além disso, o Credit Suisse não é custodiante do BVK.
Um terceiro fundo de pensão, o PKZH, patrocinado pela cidade de Zurich, tinha na semana passada menos de 0,2% de seu patrimônio investido em títulos e ações do Credit Suisse. A perda do PKZH com a desvalorização das ações do banco após a aquisição pelo UBS foi de 0,01% do patrimônio.
Por fim, o fundo de pensão da estrada de ferro federal Suíça, o PK SBB, devido a sua estratégia de investimentos passivos, pouco perdeu com a desvalorização das ações do Credit Suisse, seu nível de cobertura dos compromissos pelo patrimônio caiu ligeiramente em função da volatilidade do mercado.
Lições que os fundos de pensão brasileiros podem tirar dessa “barafunda” toda:
Os ratings de ESG usados para avaliar oportunidades de investimentos, prestam a atenção em tudo, menos no “G” do qual depende todo o resto;
A qualidade da governança é, isoladamente, o fator mais importante para determinar o futuro de uma organização, principalmente sua sobrevivência;
Uma boa governança não é aquela descrita nos manuais e papeis do conselho, mas sim aquela avaliada periodicamente de forma séria e profissional;
Se o seu fundo de pensão não conta com um Comitê de Riscos, formado com gente que entende e tem experiência em investimentos, sei não .... ;
Caso mais de 80% do patrimônio do seu fundo de pensão estejam investidos em uma única classe de ativos, mesmo que sejam títulos públicos, seu conselho tem um estranho conceito de risco e de diversificação dos investimentos.
Grande abraço,
Eder.
Fontes: Bank Turmoil Shows More Focus on Governance Needed in ESG Ratings, escrito por LaurenFoster | Swiss schemes limit losses from Credit Suisse downfall through diversification, risk monitoring, escrito por Luigi Serenelli.
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