quarta-feira, 17 de junho de 2020

COMO AS NOVAS GERAÇÕES ESTÃO MUDANDO O SISTEMA FINANCEIRO E O QUE BANCOS E FUNDOS DE PENSÃO PODEM ESPERAR – PARTE I


Crédito de Imagem: https://www.facebook.com/Blendermaroc/



De São Paulo, SP.

Outro dia li num artigo que “se você não está confuso sobre o que está acontecendo, então você não está prestando atenção”. Deve ter sido o mesmo autor do famoso “se você é o único a manter a calma enquanto todos a sua volta estão desesperados, é sinal de que você não entendeu bem o problema”.
Está em pleno andamento uma profunda transformação na relação das gerações mais novas com o sistema financeiro tradicional, que poderá ter desdobramento na atuação dos bancos em geral e dos fundos de pensão em particular.  
Numa “trilogia” de artigos vamos procurar analisar os indutores dessa transformação, as mudanças em curso e que impactos se pode esperar nos atuais modelos de negócios dessas instituições. 
Crises econômicas globais como a de 2008 e a pancada recessiva causada agora pelo COVID-19, afetam os jovens em início de carreira, postergam a acumulação de patrimônio, adiam sonhos e contribuem para mudar a perspectiva das novas gerações sobre investimentos e planos de aposentadoria.
Dentre os principais indutores das mudanças que estão por vir, destacam-se: o cenário de juros baixos, que chegou para ficar, novas tecnologias disruptivas e a visão de mundo dos jovens, esta última mal compreendida e aparentemente ignorada por grande parte dos investidores institucionais. 
Crises econômicas e o distanciamento do sistema financeiro tradicional
Bloomberg Analytics aponta que os millenials representam atualmente a maior parcela da força de trabalho dos EUA, onde somam 35%. Se acrescentada a Geração Z, dois em cada três trabalhadores americanos serão jovens adultos. Aqui no Brasil essas duas gerações já respondem por 58% de toda a população.
A crise global de 2008 afetou profundamente a geração dos millenials que, comparada aos baby-boomers na mesma idade nos EUA, acumulou metade do patrimônio, têm metade dos investimentos e ganha 20% a menos. 
Como consequência, eles postergaram o casamento, adiaram a compra da casa própria e desenvolveram uma relação superficial com o sistema bancário. Isso fez com que a Geração Z crescesse olhando para os bancos com certa desconfiança. Tanto que a maioria busca aconselhamento sobre finanças com familiares, amigos ou pesquisando sites online, ao invés de recorrer aos seus gerentes de banco.   
De acordo com o “Millennials Disruption Index”, da Viacom Midia53% dos millennials acreditam que seu banco oferece os mesmos serviços que qualquer outro banco e 33% acham que um banco é desnecessário.
Um quarto dos millenials diz ter preocupações frequentes com a segurança financeira e entre os principais fatores que os deixam estressados estão: não poupar o suficiente (35%), o rumo de suas carreiras (24%) e a falta de um planejamento adequado para a aposentadoria (21%). 
Nesse sentido a Geração Z se parece bastante com a antecessora, 71% dos que já estão empregados dizem estar de moderadamente a muito estressados sobre suas finanças e 66% tem medo do salário dar apenas para pagar as contas do mês-a-mês.
Isso tudo mostra que, diferentemente das gerações mais antigas, os jovens de hoje são muito mais receptivos a procurar satisfazer sua jornada financeira com alternativas à margem dos bancos tradicionais. Motivos semelhantes levam a supor que eles também estejam abertos a soluções de poupança além dos planos de previdência.
O interessante é que apesar de todo esse stress financeiro, a maioria tanto dos jovens millenials (83%) quanto da Geração Z (89%) é otimista em relação ao seu futuro financeiro, abrindo uma verdadeira avenida para exploração de soluções que os ajude em suas jornadas financeiras. 
Tecnologia como grande indutor das mudanças, mas não o único
Se por um lado os millenials foram criados em meio a expansão da tecnologia digital a Geração Z, por outro, não consegue nem imaginar um mundo desconectado da Internet. Ambas as gerações enxergam a tecnologia como um meio para resolver seus problemas e esperam que as soluções digitais sejam intuitivas, simples de usar e acessível por diversos canais integrados.
Três de cada cinco jovens da Geração Z dizem que não usariam um aplicativo ou website difícil de navegar ou lento para ser carregado.
As jovens gerações buscam soluções financeiras alinhadas com seus valores, que tem a ver com transparência, custo e liberdade de escolha. Por exemplo, se você é um jovem ligado em bolsa de valores e o Gilson Finkelsztain – Presidente da B3, disser algo que te deixe chateado, você não pode propriamente parar de operar na B3 e liquidar toda sua carteira de ações, porque a única opção para negociação da maioria dos papeis no Brasil passa obrigatoriamente por lá.
Já no mundo das criptomoedas, as coisas nunca são monótonas. Se a corretora de crypto com a qual você trabalha fizer alguma coisa que você discorde veementemente, você simplesmente leva seus criptoativos para outro lugar, opções não faltam.
BTW, esse mercado de capitais emergente parece nem precisar de supervisão para impor um bom comportamento aos seus agentes, porque a esmagadora maioria é composta por jovens e eles são sensíveis a todos os fatores mencionados anteriormente. 
Isso chama a atenção para o valor da transparência, o poder das escolhas e a importância da conexão com a comunidade. Não seria surpresa descobrir que o mercado de capitais tradicional está assistindo a tudo isso com bastante interesse.
A Geração Z tem mente aberta e quando se trata de aplicativos financeiros preferem plataformas digitais para transferência de dinheiro, como PayPal, Venmo e Google Pay. Nos EUA, estão entre os primeiros que usaram apps como Coinbase e Robinhood, para negociação de criptomoedas.
Se você quer entender como funcionarão bancos e fundos de pensão no futuro, preste atenção aos hábitos e preferências da geração que em breve vai dirigir a economia mundial. Como 98% da Geração Z tem um smartphone, que possuem em média desde os 10 anos de idade, diante de tanto conteúdo digital a disposição eles são muito exigentes nas escolhas. Eles cresceram vendo os perigos enfrentados pelos millenials, que deixaram uma grande pegada digital, então optam por aplicativos que publicam posts temporariamente ou de forma privada como Snapchat e Instagram. São muito menos propensos a partilhar seus dados pessoais e se afastaram das mega-plataformas como Facebook e Twitter.



Propósito, liberdade, trabalho e crenças - como funcionam as novas gerações
A Geração Z entende bem a importância do lucro, mas acredita que as empresas deveriam buscar, também, um impacto positivo na sociedade e no meio ambiente, além de priorizar diversidade e inclusão no local de trabalho. 
Para os millenials, o equilíbrio entre trabalho e vida pessoal está no topo das prioridades, com mais da metade dizendo que sua paixão é mais importante que seu contracheque. A Geração Z demonstra, desde cedo, uma forte ética em relação a trabalho. Eles planejam trabalhar durante os estudos universitários (38%) e mesmo antes disso 25% já possuem um trabalho em tempo parcial enquanto 22% ganham algum dinheiro com bicos e pequenas tarefas. 
Para a Geração Z, que está marchando contra as mudanças climáticas e cunhou o termo “Ok, Boomer”, a experiência do consumidor na jornada financeira não está centrada apenas em obter o maior retorno possível para suas aplicações. As gerações mais jovens buscam, também, associar seus investimentos a um proposito pessoal, marcado por uma forte preocupação com justiça social e questões ambientais. Eles têm horror a discriminação.
Apesar de mal ter entrado no mercado de trabalho, a Geração Z já gasta anualmente US$ 44 bilhões e influencia gastos familiares de outros US$ 600 bilhões. A relativa prosperidade que vinham experimentando lhes deu uma independência que seus antecessores millenials não tiveram, por causa da recessão global de 2008. Muitos “GenZ”, como são algumas vezes chamados, deixaram a casa dos pais ainda jovens para morar sozinhos e se entregaram ao empreendedorismo em maior número do que os millenials.
Estudos mostram que a GenZ se interessa mais por serviços contínuos do que por pagar por um único item ou por uma experiência única. Isso explica o sucesso de serviços por assinatura como Netflix e Spotify e preferência pelo aplicativo do Uber ao invés de corridas de taxi. 
Oportunidade para fundos de pensão, desde que sob novo modelo de negócio
A despeito dos percalços enfrentados no início da vida profissional, os millenials cresceram, seguiram em frente e os mais velhos estão hoje beirando os 40 anos. Muitos acabaram se tornando melhores em lidar com dinheiro do que as gerações anteriores. Cerca de 2/3 deles poupam, 54% fazem orçamento doméstico e 57% seguem a risca os objetivos financeiros que traçaram em seus orçamentos. 
Quase metade dos millenials se planeja com orçamento doméstico, possui em média US$ 15 mil em suas poupanças e os principais objetivos de suas economias são: fazer frente a emergências (64%), juntar para a aposentadoria (49%) e economizar para compra da casa própria (33%). 
Apesar da Geração Z ainda ser muito nova para tirarmos conclusões sobre seu comportamento financeiro, começam a emergir aqui e ali alguns padrões e tendências de como esses jovens organizam suas finanças. 
Um estudo sobre a Geração Z feito em 2017 pelo CGK - Center for Generational Knetics intitulado Meet The Throwback Generation apurou que 35% deles planejam começar a poupar a partir dos 20 anos de idade, comparados com 12% dos millenials
Outro estudo, dessa vez um relatório do “Betterment for Business” apontou que 88% poupa ativamente ao menos parte do que ganham mensalmente, 73% contribuem para aposentadoria com no mínimo 3% da renda e 23% contribuem com mais de 8%.
Se não houver desvios ao longo do tempo e a tendência apontada por todos esses dados se concretizar, a Geração Z será a primeira a chegar na aposentadoria com uma situação financeira melhor do que as anteriores. 
Eles são muito cautelosos com dívidas e desde cedo 37% tem cartão de crédito, com 8 em cada 10 tendo adquirido o cartão aos 18 anos de idade ou mais cedo. A Geração Z tem tudo para se dar bem com crédito e poupança, 60% deles planejam obter empréstimo estudantil para pagar a faculdade e metade desses espera ter que pegar emprestado uns US$ 30 mil. 
Prever o futuro implica em estar de olho nos dados, antecipar tendências, conforme muito bem ilustrado por uma frase sensacional que vi no website da App Annie (https://www.appannie.com), uma das maiores agências mundiais de dados de inteligência de mercado de dispositivos moveis:
“.... produtos e estratégias de publicidade feitos sob medida para as demandas da Geração Z, são vitais para o sucesso futuro das marcas. Deixe de fazer isso e você estará arriscando terminar do lado errado da briga entre Netflix e Blockbuster” 

Grande abraço,
Eder.


Fonte: Adaptado dos seguintes artigos:



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