De São Paulo, SP.
Lendo um artigo esses dias, me deparei com um conceito bem interessante.
“Liquidez mental”: é a capacidade de se abandonar rapidamente crenças anteriores quando o mundo muda ou quando você se depara com novas informações.
Parece fácil né? Mas liquidez mental é coisa rara. Mudar de ideia é difícil. É mais fácil você se deixar enganar por algo falso do que admitir que aquilo em que acreditava mudou.
Einstein detestava a ideia de uma física quântica. Sua própria teoria era uma extensão da física Newtoniana clássica, que enxerga o universo funcionando de modo racional e de maneira que pode ser medido com precisão.
Aí ... surgiu a física quântica, uma ideia meio maluca de que não se pode medir alguns elementos do mundo físico, porque o próprio processo de mensuração de uma partícula subatômica altera seu movimento.
O máximo que podemos fazer ao tentar medir algumas partes do mundo físico é assumir a probabilidade de certas coisas acontecerem.
Para Einstein isso era quase uma heresia e ele deixava claro para seus pares o que achava da física quântica naquela época. Em 1927, falando para um grupo de físicos, ele disse:
“Você não pode criar uma teoria a partir de um monte de ‘talvez’. Deus não joga dados”
Mesmo quando começou a ter algumas dúvidas sobre a nova teoria, Einstein se manteve firme e profissional. Em certa ocasião comentou com um entrevistador:
“Tenho o mais alto grau de admiração pelas conquistas das gerações mais jovens de físicos, como a chamada mecânica quântica, mas acredito que restringi-la às leis da estatística será algo passageiro”
Colegas da comunidade cientifica sentiam-se desapontados. “Einstein, estou envergonhado contigo”, declarou o físico quântico Paul Ehrenfest, considerando que o grande físico estava sendo tão teimoso quanto aqueles que inicialmente duvidaram da teoria da relatividade de Einstein.
Cinco anos depois disso, um grupo de físicos quânticos ganhou o Prêmio Nobel de Física, validando a teoria quântica e solidificando sua contribuição para o campo da física teórica.
Não foi mencionado durante a cerimonia de premiação, mas foi o próprio Einstein quem indicou o grupo para ganhar o prêmio e escreveu em seu voto:
“Estou convencido de que essa teoria (quântica) indubitavelmente contém uma parte da verdade universal”
Einstein havia mudado de ideia.
O que a maioria das pessoas chama de convicção é, na verdade, um desprezo pelos fatos que as pode fazer mudar de ideia.
Isso é perigoso porque convicção soa como um atributo bom, enquanto seu oposto - ficar em cima do muro – faz a gente soar e parecer fraco.
Em psicologia existe um conceito chamado de “Ilusão do Fim-da-História”. É a ideia que as pessoas têm de que, apesar de suas personalidades e pensamentos terem mudado muito no passado, seu modo de enxergar o mundo não mudará tanto no futuro. Escrevi sobre isso: aqui
Damos risada sobre como pensávamos quando tínhamos 20 anos de idade, mas assumimos aos 40 que seremos praticamente as mesmas pessoas aos 60.
Isso ocorre, em parte, porque é muito doloroso aceitar que nossas crenças atuais podem estar erradas, serem passageiras ou subjetivas.
Investimos tempo e esforços naquilo que acreditamos, machuca reconhecer que o ROI (retorno sobre o investimento) das convicções pelas quais nós tanto lutamos, pode ser limitado e ter data de validade.
Existem muitas coisas na vida – particularmente em questões políticas e de investimentos - para as quais as pessoas não querem necessariamente a verdade, elas querem a certeza.
Mudar de ideia é difícil porque é a admissão de que aquela certeza que você pensou ter era, na verdade, ilusória. É mais fácil se agarrar às suas crenças pelo resto da vida.
Teste o que pensa o conselho do seu fundo de pensão
Experimente perguntar para seus conselheiros deliberativos:
“Sobre o que você mudou de ideia (ou de convicção) nos últimos cinco, dez anos?”
O prazo maior força a pessoa a pensar em coisas mais significativas, não em quem ela acha que vai ganhar o Brasileirão (futebol) esse ano.
Eu ficaria muito desconfiado se ouvisse algum conselheiro dizendo, “nada”. Talvez quem responda isso ache ser um sinal de inteligência – o fato de seu conhecimento ser tão preciso que não é necessário mudar.
Eu acho que é um sinal de teimosia ou ignorância em relação ao mundo ao redor. Se diante do futuro do trabalho, da economia digital, dos novos vínculos de emprego, da IA, enfim, de tudo que mudou na última década, um conselheiro continuar vendo a previdência complementar da mesma forma que a via há mais de cinco anos, comece a se informar melhor sobre o instituto da portabilidade ...
Um dos fundadores do cartão de crédito Visa, Dee Hock, costumava dizer:
Uma crença não é perigosa, até ela se tornar absoluta
Quando suas crenças se solidificam, você começa a ignorar informações que podem forçá-lo a rever suas ideias e atualizá-las.
Pode parecer estranho, mas aquilo sobre o que você tem a maior convicção é que tem mais chance de estar errado ou incompleto, justamente por ser a coisa mais difícil de mudar, atualizar e abandonar quando for necessário.
Acenda uma luz amarela se o conselho do seu fundo de pensão tiver convicções firmes tipo: planos CD são o melhor meio atual de se poupar para o futuro; as pessoas que mais precisam de cobertura da previdência complementar são aquelas que ganham muito acima do teto do INSS; títulos públicos constituem a melhor classe de ativos para fundos de pensão, governança é o menor dos riscos que temos em nossa entidade de previdência; o único lugar para procurar novos conselheiros é nas patrocinadoras etc.
Tenha cuidado especial com crenças que se tornam parte da identidade (cultura) corporativa do seu fundo de pensão.
Religião e política são polêmicas porque quase por definição são crenças que fazem parte de sua identidade – você não está lidando apenas com ideias e filosofias, mas com tribos e pertencimento, algo que cai no campo das emoções, não da razão.
“Somos criados com uma capacidade quase que infinita de acreditar nas coisas, porque as crenças são vantajosas para nós, não porque estejam remotamente relacionadas com a verdade”, diz também Dee Hock.
As coisas podem se tornar um problema quando, num ambiente de baixa “Liquidez Mental”, as pessoas classificam na mesma categoria: sua crença na empresa patrocinadora, sua crença no fundo de pensão e sua crença na segurança financeira futura.
Grande abraço,
Eder.
Fonte: Mental Liquidity, escrito por Morgan Housel
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