De Sāo Paulo, SP.
Muitos profissionais na previdência complementar corporativa dariam risada se eu dissesse para eles que por trás de um ramo de estudos chamado Matemática Biológica, se escondem mistérios sobre o futuro dos fundos de pensão.
Movido pelo meu hiperativo estado de “ler-tudo-que-cruza-meu-caminho,” ao longo dos 16 anos em que escrevo no meu blog, tenho me deparado com um monte de tópicos que tem correlação intrínseca com os fundos de pensão.
Um artigo, em particular, chamou muito minha atenção esses dias. Tem a ver com uma explicação matemática para haver um limite no tamanho dos seres vivos, que se aplica indistintamente a tudo quanto é fenômeno. Mostra, inclusive, porque o futuro dos fundos de pensão não está em aumentar sua escala.
Como assim Eder? Bem, vamos lá. Vou te guiar para você entender o raciocínio. Mantenha a mente aberta e siga devagar o encadeamento das explicações.
A Lei de Kleiber e limitação do tamanho dos animais
Max Kleiber foi um biólogo dos anos 1930. Ele constatou que quando as taxas de metabolismo de várias espécies são comparadas às suas massas corporais em escala logarítmica, todos os pontos caem numa reta, com inclinação de 3/4.
A Lei de Kleiber se aplica desde a menor das bactérias até a baleia branca, o maior dos animais. Estamos falando de 20 graus de magnitude! Você precisaria multiplicar vinte vezes por 10 a cada multiplicação, para ir da bactéria até a baleia.
Olhando a reta acima você pensaria que a relação entre a taxa de metabolismo e o tamanho do corpo é de um-para-um, afinal, tamanho é uma medida da quantidade de células e quanto maior o número de células, maior a taxa de metabolismo.
Porém, a extrapolação da taxa de metabolismo com respeito ao tamanho do corpo, não é linear. O que o gráfico mostra, na verdade, é que a taxa de metabolismo diminuiu de forma relativa, na medida em que aumenta o tamanho do corpo/massa do corpo. Isso significa que a taxa de metabolismo de um rato é maior, em relação ao seu peso corporal, quando comparada a de um gato.
Dito de outra forma um gato, que tem massa corporal 100 vezes maior do que um rato, consome apenas 32 vezes a energia usada por um rato, no mesmo intervalo de tempo. E há uma elegante explicação par isso.
Tudo se resume a um problema de sistema de suprimento.
Corpos que são pequenos o suficiente para obter recursos da simples difusão através de suas superfícies corporais, podem se dar ao luxo de ter uma taxa metabólica mais elevada e um ritmo de vida mais intenso (por exemplo, bactérias)
Mas na medida em que aumenta o tamanho corporal, a difusão (transporte de substâncias essenciais ao metabolismo celular) simplesmente não é mais capaz de abastecer as necessidades corporais. Aí entra o sistema de suprimento.
Os insetos possuem tubos, chamados traquéolas, para transportar ar para seus tecidos. Nós também temos esses tubos, concentrados em um par de órgãos chamados pulmões, supridos por uma densa rede capilar que facilita a troca gasosa e o transporte de recursos para todas as células. Nos peixes são as guelras, órgãos que ocupam uma extensa área com a mesma finalidade.
Essas redes vasculares ramificadas ocupam algum volume e competem por espaço com as células para as quais fornecem recursos. Se você dobrar a quantidade de células que precisam ser abastecidas, o volume do sistema de suprimento precisa ser mais do que dobrado.
Se o tamanho do sistema de suprimento fosse apenas dobrado, o volume de abastecimento vascular se tornaria esparso e insuficiente, não conseguiria mais atender totalmente as necessidades das células de um corpo de tamanho maior.
Alem disso, notou-se que o sistema de transporte mais eficiente – seja de um rato ou de uma baleia – é aquele que ocupa um percentual fixo do volume de um corpo. Por exemplo, todos os mamíferos têm volume de sangue entre seis e sete porcento do seu corpo.
Isso significa que se quisermos dobrar a quantidade de células, mantendo esse sistema mais eficiente de suprimento de recursos, ele precisa ser um sistema esparso. Consequentemente, na medida que a oferta de suprimentos diminui, também vai diminuir a taxa de metabolismo dos animais com o aumento do tamanho corporal.
Essa é a razão pela qual a vida de animais menores acontece em um ritmo mais rápido, seu batimento cardíaco é maior e sua expectativa de vida é menor (todo mamífero tem o mesmo no de batimentos cardíacos ao longo da vida: 1,5 bilhões)
Por causa da redução da taxa de metabolismo com o aumento do tamanho, nosso crescimento (tamanho) se torna limitado. Chega um ponto em que os recursos passam a ser desviados para manutenção das células existentes, ao invés de se dedicarem a fabricação de mais células para aumentar o tamanho.
O que acontece com o aumento de escala na natureza
Existe um fenômeno interessante associado ao aumento da escala, na medida em que o tamanho de um corpo vai crescendo.
A força de qualquer parte do corpo é proporcional a sua área de secção transversal. Pense em um membro. Agora, à medida que o tamanho do corpo aumenta, a área da seção transversal aumenta de forma não linear.
Considere um quadrado com comprimento “L” de seus lados. Se dobrarmos o comprimento do lado, a área será quadruplicada (2L x 2L = 4L2), mas o volume torna-se oito vezes maior (2L x 2L x 2L = 8L3).
Se o comprimento aumenta dez vezes, a área cresce cem vezes e o volume aumenta mil vezes! Isso se aplica a qualquer forma, desde que a escala seja geométrica, ou seja, a forma permaneça a mesma.
Significa, na medida que um corpo aumenta de tamanho (considerando que a forma do corpo permanece a mesma) que a força relativa ao tamanho do corpo, diminui. Por isso que uma formiga consegue carregar uma folha cem vezes maior do que o peso do seu próprio corpo e nós não.
Se aumentarmos o tamanho de um rato, dimensionando-o para o mesmo tamanho de um elefante (mantendo a mesma forma), suas pernas magras nāo seriam capazes de suportar o peso do corpo. Isso acontece porque a força é proporcional à área de secção transversal, mas o tamanho do corpo é proporcional ao volume.
Agora, como o volume aumenta em 3/2 ordens de magnitude para cada ordem de magnitude de aumento na área, a força do corpo continua diminuindo em relação ao tamanho do corpo à medida que o tamanho do corpo aumenta.
E como o peso a ser suportado pelo corpo é uma função do volume, é necessária uma escala supralinear da área da secção transversal em muitas partes. É por isso que os elefantes possuem aqueles verdadeiros pilares, grossos, como pernas. Trata-se de uma necessidade, considerando um corpo daquele tamanho.
Além disso, como a área diminui em relação ao volume, à medida que o tamanho do corpo aumenta, funções que dependem da área da superfície, como a transferência de calor, são afetadas.
Para contornar esse problema, os elefantes desenvolveram enormes orelhas que proporcionam áreas de superfície que ajudam na perda de calor.
Essa é a razão pela qual árvores não podem crescer indefinidamente e a altura média dos seres humanos é limitada. As arvores seriam esmagadas pelo peso de seus próprios galhos e as pessoas pelo peso de seus próprios ossos.
Sem uma compensação no aumento da área de secção transversal, um aumento indefinido de volume não é sustentável. Por isso, que a existência de um monstro como o Godzilla dos filmes japoneses ou dos gigantescos vermes de areia no filme Dune seria impossível, eles seriam esmagados pelo próprio peso.
As consequências de desconhecer o aumento de escala
O aumento de escala é um fenômeno interessante e mostra que tudo no universo é baseado em certas leis gerais, que transcendem história, cultura, geografia, biologia, negócios e fundos de pensão.
Ignorar os efeitos do aumento na escala pode ter consequências desastrosas. Em 1962 um grupo de pesquisadores estudou os efeitos do LSD em elefantes asiáticos.
Os elefantes são conhecidos por passar por um período de transição entre seu plácido comportamento normal e um estado agressivo, que dura cerca de duas semanas. Os pesquisadores especularam que o bizarro comportamento se devia a autoprodução de dietilamida do ácido lisérgico (LSD) no cérebro dos animais.
Fizeram, então, um teste para ver se o LSD poderia induzir tal comportamento nos elefantes. Sabia-se que uma dose segura em gatos era de 0,1mg por kg de peso corporal. Assim, os pesquisadores extrapolaram a dose para o peso de Tusko (o elefante da pesquisa), que pesava 3.000kg.
Tusko foi injetado com 0,1mg x 3.000kg = 300mg de LSD (para ser exato, 297mg). Os pesquisadores descreveram, assim a reação:
Cinco minutos depois da injeção ele cambaleou, tropeçou e caiu estrondosamente sobre seu lado direito, defecou e entrou em estado epilético. Tusko morreu uma hora e quarenta e cinco minutos depois.
Mais chocante ainda foi a conclusão dos pesquisadores, vítimas da sedutora armadilha do pensamento linear, concluíram ser os elefantes proporcionalmente sensíveis ao LSD.
As drogas são absorvidas e transportadas por difusão, através da superfície das membranas. Portanto, a dose deveria ter sido determinada com base na escala da área da superfície do animal e não no volume/massa do mesmo.
Organismos maiores possuem uma área de superfície menor em relação ao volume, assim, a concentração da droga no sangue aumenta devido a diminuição da depuração metabólica, quando comparada com animais menores (gatos).
Olha que essa pesquisa foi publicada no prestigioso jornal científico Science. O maior fator de insucesso das pesquisas de medicamentos é que os estudos são feitos com ratos de laboratório, que depois tem dificuldades consideráveis para escalonar para o tamanho do corpo de seres humanos.
O fenômeno do escalonamento em atividades sócio-econômicas
O aumento de escala não se limita a biologia. Ele também perneia o tecido socioeconômico. As empresas, por exemplo, crescem rapidamente nos primeiros anos, mas diminuem a velocidade quando vão amadurecendo, até que param de crescer em relação ao PIB.
Na medida em que a empresa cresce em tamanho, uma parte significativa dos recursos são direcionados para estabelecer uma solida administração e atender a burocracia. Os desafios de se administrar eficientemente uma organização grande e complexa superam a necessidade de inovação e leva a estagnação e finalmente a morte da empresa.
Metade das empresas de capital aberto de qualquer setor nos EUA desaparece dentro de 10 anos e poucas sobrevivem até 50. A inclinação da reta é de cerca de 0,9 comparada com 0,75 (3/4) dos organismos vivos.
Quando se trata de cidades, no entanto, a escala é tanto sub-linear (inclinação < 1) como supra-linear (inclinação >1).
Quando uma cidade cresce, sua infraestrutura diminui em relação ao tamanho da população. Quanto maior a cidade, menos ruas e fiação elétrica per capita são necessários. A inclinação resulta em 0,85.
No entanto, se olharmos para quantidades sócio-econômicas nessas cidades, como salários, patrimônio, casos de AIDS, crimes, educação e patentes, elas crescem supra-linearmente com uma inclinação de 1,15.
Ou seja, se a população de uma cidade dobra, então, todos os fatores acima crescem 15% acima da duplicação.
Esse aumento sistemático no ritmo da vida, na medida em que uma cidade cresce, é algo que você (leitor) deve ter experimentado ao longo da sua própria vida. Doenças se espalhando mais rapidamente, empresas nascendo e morrendo mais rápido, as pessoas andando mais depressa, tudo seguindo a métrica dos 15%.
As dinâmicas sociais subjacentes à criação de riqueza e à inovação, levam a um crescimento exponencial dos fatores acima.
Mas, de acordo com a Teoria da Singularidade do Tempo-Finito, um crescimento ilimitado das cidades não seria possível com os recursos finitos que possuímos. Haveria um potencial colapso da civilização.
As únicas soluções possíveis seriam: termos recursos infinitos ou ocorrer uma grande mudança no paradigma, que reiniciasse a contagem do tempo antes que o colapso acontecesse.
As grandes mudanças no paradigma foram, no passado, inovações como a descoberta do aço, carvão, vapor, computadores e tecnologia da informação.
No entanto, tem uma outra pegadinha. A teoria diz que tais descobertas precisam acontecer num ritmo cada vez mais acelerado ou seja, o intervalo de tempo entre descobertas sucessivas precisa ser cada vez menor.
Por exemplo, o tempo decorrido entre a “Era do Computador” e a “Era Digital” foi de cerca de 20 anos, enquanto o intervalo entre a “Idade da Pedra”, “Idade do Bronze” e “Idade do Aço” demorou milhares de anos.
Não apenas o ritmo da vida inevitavelmente aumenta, mas precisamos inovar a um ritmo maior do que no tempo anterior. Essas mudanças de paradigma, caso não aconteçam, farão as cidades caminhar para um colapso iminente.
Isso vale para empresas e fundos de pensāo. O futuro imediato pode se mostrar um pouco diferente, mas a analise quantitativa como um todo, leva a resultados bastante similares.
A matemática, não há duvida, é a linguagem do universo.
Grande abraço,
Eder.
Opinōes: Todas minhas | Fonte: “The Hidden Order of the Universe”, escrito por TheUnknownDoktor.
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