segunda-feira, 29 de janeiro de 2024

A NOVA FRONTEIRA DA POUPANÇA PARA O FUTURO VIRÁ DE INOVAÇŌES FORA DO SETOR DE PREVIDÊNCIA COMPLEMENTAR

 


De Sāo Paulo, SP.


Da mesma forma que está acontecendo com os bancos, o impacto da tecnologia sobre a poupança para a aposentadoria será surpreendente. As mudanças já estão tomando corpo e um aumento crescente nas opções de investimento de longo prazo vem surgindo, inteiramente à margem do segmento de previdência complementar. 

Evolução da poupança para a aposentadoria

A disruptura tecnológica tem criado uma gama inteiramente nova de concorrentes de bancos, fundos de pensão e dos tradicionais operadores de planos de previdência complementar individuais. Esses concorrentes estão oferecendo aos consumidores outras formas de poupar para o futuro, mais convenientes, com taxas menores e alternativas de investimentos mais atraentes.

Esse crescimento explosivo de serviços tem sido capitaneado por grandes empresas de tecnologia e vai pavimentando o caminho em direção a um novo capítulo na poupança para a aposentadoria. 

Grandes nomes e variedade de produtos financeiros não-bancários

Existe uma gama crescente de produtos financeiros oferecidos pelas maiores empresas de tecnologia que não são bancos, as BigTechs.

O Google oferece uma série de serviços financeiros baseados em nuvem, incluindo o Google Finance para cotações de mercado em tempo real e notícias financeiras, o Google Wallet para controle de cartões de crédito, passagens e programas de recompensas (fidelidade) e o Google Pay para pagamentos online.

A Apple tem o Apple Card para pagamentos de serviços sem cobrança de juros e o Apple Pay que permite pagamentos através de smartphones e dispositivos móveis, além de oferecer o serviço de carteira digital.

A Meta (ex-Facebook) não fica atrás, oferece uma variedade de conteúdos para educação financeira, serviços de pagamento digital via Meta Pay e esteve envolvida na criação da Libra – uma moeda digital baseada no blockchain e cryptografia.

A Amazon e o Alibaba contam com suas próprias plataformas de pagamento, incluindo o Amazon Pay e o Alipay, tendo esse último se transformado no maior competidor do PayPal que ainda segue como a plataforma dominante de meios de pagamento moveis.

Uma enormidade de empresas de tecnologia está envolvida na prestação de serviços não-bancários nos EUA, Europa, Asia e mesmo no Brasil:

  • PayPal e Stripe — processadores de pagamentos online;
  • Square e Zelle — provedores de pagamentos digitais, sendo esse último apoiado pelos principais bancos;
  • Venmo — serviços de pagamentos móveis;
  • WeChat Pay — serviços de carteira digital;
  • Coinbase — plataforma de cryptomoedas;
  • Robinhood e Betterment — plataformas de trading (negociações de títulos e valores mobiliários) online;
  • SoFi — financiamento imobiliário, crédito estudantil, empréstimo pessoal, refinanciamentos, seguros, poupança e previdência digitais;
  • Upstart, Prosper e LendingClub — serviços de empréstimo peer-to-peer (entre indivíduos) 

Competição que complementa soluções e beneficia consumidores

Uma quantidade cada vez maior de empresas de tecnologia envolvida com serviços financeiros está criando um ambiente que complementa e compete diretamente com os serviços financeiros tradicionalmente prestados por bancos.

O sistema financeiro tem consistido tanto em bancos grandes como bancos pequenos, instituições de crédito, financiamento imobiliário e outros prestadores de serviços bancários regulados. 

O que estamos vendo agora são instituições não-bancárias contribuindo para diversificar a oferta de empréstimos, linhas de crédito, investimentos privados e poupança de longo prazo. 

Os nāo-bancos estão prestando um serviço de alto valor para os consumidores, não estão apenas diversificando as atuais opções de prestadores de serviços disponíveis, dentre as quais o consumidor pode escolher, mas criando verdadeira competição com o sistema financeiro. Essa pressão vem forçando uma redução drástica das taxas de administração cobradas pelos serviços financeiros e melhorando a qualidade dos produtos.  

Com a oferta crescente de produtos financeiros próprios pelas bigtechs, é inevitável o aumento da competição entre bancos e nāo-bancos. Essa concorrência poderá ter implicações graves para o atual mercado financeiro, incluindo as instituições que operam meios de pagamento, empréstimos, poupança, seguros e previdência complementar.

Essa competição, provavelmente, vai ter implicações regulatórias, com o foco na proteção ao consumidor, privacidade dos dados individuais etc. 

Valor de mercado

As grandes empresas de tecnologia têm valor de mercado extremamente elevado quando comparadas com bancos tradicionais e com os maiores fundos de pensão do mundo. 

Um relatório da McKinsey mostra que em 2020 a capitalização de mercado das sete maiores bigtechs era superior a US$ 8 trilhões. Isso era quase o dobro da capitalização de mercado dos 200 maiores bancos do mundo, juntos. 

Essa discrepância demonstra, claramente, que os investidores valorizam significativamente mais as empresas de tecnologia do que o setor bancário. A mudança de prioridade está remodelando muitas estratégias de investimentos. 

Vantagens sobre bancos e fundos de pensão

Não surpreende que as empresas de tecnologia e seus produtos não-bancários tenham ultrapassado a preferência em relação aos serviços bancários tradicionais.

As vantagens das empresas de tecnologia incluem sua capacidade de alavancar uma base de consumidores maior e mais fiel, dispor de vastas quantidades de dados dos clientes, produzir análises avançadas dos dados através do uso de inteligência artificial, machine learning, large language models e outros modelos. 

Além de superar bancos e fundos de pensão em sistemas e em performance, as empresas de tecnologia são capazes de alavancar o uso de plataformas digitais para oferecer serviços altamente personalizados aos clientes, mais convenientes e principalmente, a um custo mais baixo do que os bancos tradicionais. 

São vantagens que impressionam e vão deixando para trás não apenas os bancos, mas igualmente as seguradoras, os fundos de pensão e as corretoras de valores tradicionais.

Essa capacidade das empresas de tecnologia oferecerem aos consumidores serviços financeiros com extrema personalização, muito convenientes e mais notavelmente, a custos muito, muito abaixo dos praticados por bancos e instituições tradicionais, vem formando uma tempestade perfeita. 

A combinação dessas vantagens com a capacidade da venda cruzada de uma enorme gama de produtos de tecnologia fornece às grandes bigtechs habilidade para superar constantemente os bancos.   

Esse crescimento, claro, não vem sem um conjunto próprio de riscos e desafios.

Credito de Imagem: DALLE (Produzida por Inteligência Artificial)

Riscos e desafios

Na medida em que as bigtechs se tornam gigantes, com valor de mercado na casa dos trilhões de dólares e passam a oferecer serviços financeiros, cresce a preocupação com o risco sistêmico. 

Considere o risco de concentração em determinada área de investimento pelas bigtechs, como pagamentos online por dispositivos móveis ou empréstimos P2P (pessoa-a-pessoa) ou mesmo poupança de longo prazo. 

Esse cenário pode criar pressão sobre o sistema financeiro e representar risco crescente para os investidores dos bancos e participantes de planos de previdência. 

Há também o risco de contágio, resultante de uma eventual falha nos serviços prestados por uma das grandes empresas de tecnologia, que pode afetar todo o sistema financeiro. Considere o colapso de uma corretora de cryptomoedas, que tem potencial de afetar um publico maior do que a empresa de tecnologia em si.

Sem falar no risco de ataques cibernéticos e na proteção de dados. Na medida em que mais e mais bigtechs se alavancam com base na análise de dados individuais dos consumidores para oferecer produtos financeiros personalizados, o armazenamento e uso se dados privados sensíveis entra no radar dos hackers. 

Adicionalmente, as grandes empresas de tecnologia precisam ser monitoradas com relação ao seu poder de controlar mercados para assegurar uma concorrência saudável.

Por fim, dado que as empresas de tecnologia são capazes de operar fora do perímetro regulatório do sistema financeiro tradicional ou até mesmo de explorar lacunas na arbitragem regulatória em seu favor, se tornará cada vez mais importante tentar criar competição saudável com bancos, fundos de pensão e seguradoras.

Falta regulação para proteger a estabilidade

O governo e suas estruturas de supervisão precisariam se adaptar às mudanças na oferta de serviços financeiros pelos não-bancos de forma a assegurar uma competição justa com bancos e operadores de planos de previdência complementar, sem impedir essa competição.

No entanto, a resposta das políticas publicas aos serviços financeiros prestados pelas bigtehcs e não-bancos, carece de uma abordagem holística e transversal na regulação de diversos setores. 

A regulação deveria levar em consideração o modelo de negócios, as atividades e o escopo dos serviços, para avaliar o impacto no mercado e nos consumidores. Da mesma forma que existem exigências de liquidez e fluxo de caixa para bancos e limites de concentração de investimentos para fundos de pensão e seguradoras, para reduzir o risco de quebra, de perdas e o contágio sistêmico, as bigtechs e os não-bancos deveriam passar por um escrutínio semelhante de modo a proteger a estabilidade dos mercados. 

Credito de Imagem: www.blog.cute.com

Diversificação, redução de lucros e colaboração

O futuro dos serviços financeiros e da poupança para a aposentadoria, quase certamente será guiado por novas tecnologias. Como os bancos, fundos de pensão, seguradoras e operadoras de planos de previdência complementar, estão reagindo a essa competição?

Os bancos tradicionais estão lutando para não serem postos de lado, diante do avanço das bigtechs nos serviços financeiros. Eles vêm respondendo à competição dos nāo-bancos aumentando a interação com os consumidores, adotando novas táticas e até colaborando com as bigtechs.

A diversificação das atividades dos bancos passa pelo oferecimento de serviços financeiros adjacentes, mesmo que em áreas não lucrativas. Ao diversificar suas ofertas expandindo seus serviços para outros segmentos, os bancos procuram, potencialmente, reter os atuais clientes e atrair novos consumidores.

Nesse processo os bancos têm procurado aproveitar sua alavancagem e custo de capital, reduzindo suas margens de lucro, até ao ponto de zerar a lucratividade em determinados serviços para poder competir com os não-bancos.

Por exemplo, se os bancos diminuírem até determinado nível as taxas que cobram para emprestar dinheiro, isso pode tornar mais difícil para os comerciantes mudarem para as bigtechs, permanecendo com os bancos tradicionais.

Os fundos de pensão, porém, não contam com as mesmas armas que os bancos para poder reagir. Eles vem enfrentando perda de escala, há uma enorme limitação para redução de custos e é simplesmente impossível zerarem as taxas de administração que praticam.

Seus atuais modelos de negócios e suas estruturas de governança tem atuado como verdadeiro freio de mão, impedindo a diversificação de serviços e a colaboração com organizações externas.

A incursão continuada de soluções e inovações digitais nos produtos e serviços oferecidos pelos fundos de pensão e operadoras de planos de previdência complementar individuais, está determinada a mudar inteiramente todo o setor.

No curto prazo, participantes de fundos de pensão, consumidores de planos de previdência complementar individual e clientes de bancos, indubitavelmente se beneficiarão da crescente competição dos não-bancos e bigtechs

Somente uma observação atenta aos desdobramentos dessa competição será capaz de dizer o que acontecerá no longo prazo. Indícios de onde isso vai dar, já existem,

Grande abraço,

Eder.


Fonte: “The Future of Banking with Big Tech: The Next Frontier for Non-Bank Innovation”, escrito por Kory Becker.


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