terça-feira, 7 de abril de 2020

O que vai acontecer com seu fundo de pensão? Tudo bem não ter certeza, em tempos de incerteza!



Crédito de Imagem: www.cachorrogato.com.br

De São Paulo, SP.

Em 1935, dois anos depois de ganhar o Nobel de Física, Erwin Schrödinger propôs um experimento que se tornou uma das maiores contribuições para o desenvolvimento da mecânica quântica.

Schrödinger imaginou um gato hipotético colocado dentro de uma caixa, junto com uma garrafa de cianureto, um martelo ligado a um contador Geiger (instrumento que mede a radioatividade) e uma pequena quantidade de material radioativo.

A caixa, então, foi selada e ele esperou passar uma hora. O material radioativo na caixa era tão pouco, que a chance de haver um decaimento radioativo no curso de uma hora, o que acionaria o contador Geiger, era de 50/50. Se isso acontecesse e o contador Geiger fosse acionado, o martelo seria liberado, quebraria o frasco com veneno e levaria a morte do gato (vídeo explicando: aqui).

Sem abrir a caixa, podemos dizer se o gato está vivo ou morto? A resposta é: não. Até que a caixa seja aberta e saibamos se o veneno foi ou não liberado, o gato estará numa espécie de estado indeterminado – vivo e morto ao mesmo tempo ou de fato, nenhum dos dois.
    
Esse estado indeterminado é algo comum na física quântica. Em nosso mundo real, apesar de lidarmos com objetos muito maiores do que as partículas atômicas, muitas vezes também nos deparamos com situações em que não sabemos se algo é verdadeiro ou falso ou nenhum dos dois. Temos muita dificuldade em lidar com situações em que somos totalmente ignorantes - no sentido do conhecimento, não no pejorativo.

Somos todos epidemiologistas

Ontem no final da tarde participei de um “webinar” organizado por uma firma de consultoria de RH. Ouvi vários executivos partilharem suas experiências, o que pensam e o que suas empresas estão fazendo nessa crise do COVID-19.

Quando me desconectei do software de vídeo conferência, a única certeza que tive foi a de que não temos certeza de nada.

Os seres humanos têm uma profunda aversão a incerteza. A maioria do que lemos e ouvimos atualmente - produzido pela mídia, por “influencers”, por lideranças políticas ou por pessoas comuns, sem nenhum conhecimento específico - transmitem uma certeza inabalável. É como se apenas os especialistas reconhecessem que eles e somente eles, têm certeza sobre pouquíssima coisa. 

Precisamos e buscamos a certeza. Não apenas no que os outros dizem. Quando somos convidados a nos expressar sobre assuntos complexos, temos opiniões fortes e as afirmamos com base em nossas próprias certezas.

Uma pesquisa feita pela IPSOS perguntou para pessoas de diversos países com que grau concordavam ou discordavam da afirmação: “As restrições de viagem e o isolamento em larga escala não deterão a propagação do vírus COVID-19” (nota: apenas reforçando o que foi dito acima, o nome do vírus é Sars-Cov-2; COVID-19 é o nome da doença causada por ele).

A resposta sincera deveria ser: Não Sei. A maioria das pessoas não tem a mais remota ideia de quais são os vários mecanismos de contágio, qual a proporção de transmissão do vírus em cada um deles, como esses mecanismos são afetados por tais medidas em nível individual e em nível coletivo, com que abrangência as medidas estão efetivamente sendo adotadas, quando uma pessoa começa e quando deixa de ser contagiosa e por aí vai.

Mesmo assim, como mostra o gráfico abaixo, isso não impediu que as pessoas tivessem a maior convicção em suas respostas. A proporção mais alta de “Não Sei” foi na Alemanha, apenas 11%. No Brasil, míseros 5% disseram não saber (pesquisa completa: aqui).


Desconfortável, mas ok

Nós, seres humanos, não conseguimos lidar com a incerteza. Demandamos certeza do tipo preto no branco. No entanto, esse pensamento binário nos fornece uma visão distorcida do mundo. Não parece haver espaço em nossas posições para o equivalente ao gato do Dr. Schrödinger: não há lugar para “não concordo nem discordo”.

Algumas vezes, nós simplesmente não sabemos a resposta e isso não deveria ser um problema. Em um trabalho científico intitulado “I don’t know” (“Eu não sei”, em português) os professores Matthew Backus, da Universidade de Columbia e Andrew Little de Berkeley, concluíram que é do interesse de especialistas expressar desconhecimento se for impossível saber o efeito de determinada politica, ao se tomar uma decisão.

Não saber determinada coisa é desconfortável, especialmente quando temos que tomar uma decisão. Então, nos inspiramos em alguma certeza para agir, ainda que essa certeza seja imaginaria. Quando não dispomos de fatos, nos baseamos em nossa experiência passada para confirmar nossa crença e tentamos convencer os outros.   

Abandonar nosso passado, porem, significaria proclamar nossa ignorância, algo que não é fácil para as criaturas que somos, avessas a incertezas. 

Mas admitir que realmente não sabemos, permitiria reconhecer que existem múltiplas verdades. Por isso, seria bom reconhecer nossa ignorância e só fazendo isso é que podemos superá-la.

Você não sabe o que vai acontecer com seu fundo de pensão? Tudo bem não saber, ninguém sabe e só saberemos depois que a caixa com o Sars-Cov-2 for aberta ...

Grande abraço,
Eder.


Fonte: Adaptado do artigo "Embrace your ignorance", escrito por Koen Smets (https://medium.com/@koenfucius/embrace-your-ignorance-9c0948cd2a98).


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