quarta-feira, 13 de setembro de 2023

A LIDERANÇA DOS FUNDOS DE PENSĀO TEM UMA VISĀO SISTÊMICA DO NEGÓCIO DE PREVIDENCIA OU ENXERGA APENAS SUAS PARTES?

Internet moderna - Teoria Grafica e Redes Complexas;Vrije Universiteit Amsterdam

De Sāo Paulo, SP.


O conhecimento é abundante na era da informação. A sabedoria, nem tanto. O conhecimento ensina que os fundos de pensão estão no negócio de planos de previdência complementar. A sabedoria diz que o negócio deles é ajudar as pessoas na busca de segurança financeira.

O que falta aos conselhos deliberativos e à liderança executiva dos fundos de pensão é uma visão sistêmica do seu negócio. As decisões gerenciais que vem sendo adotadas para levar os fundos de pensão ao futuro, tem sido antissistêmicas.

Como assim? Bem, primeiro, é preciso entender o que é um sistema.

O que é um sistema?

Um sistema é um todo que consiste de partes, cada uma das quais pode afetar seu comportamento ou suas propriedades.

Uma pessoa, por exemplo, é um organismo biológico que consiste em várias partes – coração, pulmões, pâncreas, cérebro etc. – cada uma das quais pode afetar seu comportamento ou suas propriedades (funcionamento).  

Quando cada parte afeta o sistema, o efeito depende também daquele causado por alguma outra parte do sistema. Em outras palavras, as partes do sistema são interdependentes.

Nenhuma parte do sistema ou coleção de partes do sistema tem um efeito independente sobre o sistema. Portanto, a maneira que o coração afeta o individuo depende do que os pulmões dele estão fazendo, o que o cérebro dele está fazendo. As partes são todas interconectadas.

Por isso, um sistema não pode ser dividido em partes independentes. Isso tem implicações muito, muito importantes para o negócio dos fundos de pensão, que vem sendo desprezadas e são cruciais para qualquer um preocupado com sua sustentabilidade futura.

Lição # 1 – As características de um sistema

As características ou as propriedades essenciais de qualquer sistema, são propriedades do todo, que nenhuma de suas partes possui individualmente.

Por exemplo, um sistema elementar com o qual todos estamos familiarizados é o automóvel. A propriedade essencial de um automóvel é poder transportar algo de um ponto para outro. Nenhuma parte do automóvel pode fazer isso, as rodas não podem, os assentos não podem, o volante não pode, o motor não pode. O motor não pode nem carregar a si próprio de um lugar para o outro, mas o automóvel pode.

A pessoa tem uma característica biológica importante, que é sua propriedade essencial, a vida. Nenhuma parte do corpo tem a vida. A pessoa pode escrever, a mão dela não pode escrever. Ela pode pensar, o cérebro dela, sozinho, não pode.

Quando o sistema é desmembrado, ele perde suas propriedades essenciais. Se desmontarmos um automóvel, apesar de termos cada uma de suas partes na nossa frente, não teremos um automóvel, porque um sistema não é a soma de seus comportamentos, não é a soma de suas partes, mas sim o produto de suas interações.

Para reflexão – um fundo de pensão pode entregar segurança financeira para determinada pessoa, os investimentos sozinhos não podem, o desenho do plano não pode, a forma de pagamento dos benefícios não pode, a entrada de novos participantes e/ou patrocinadoras não pode, um conselho deliberativo com a melhor governança do mundo não pode, a soma de todas essas partes não pode. Apenas a interação dessas partes é capaz de fazer isso.


Credito de Imagem: https://university.apeejay.edu


Lição # 2 – Como melhorar um sistema

Se você tiver um programa de melhoria de um sistema, focado em melhorar suas partes separadamente, você pode ter absoluta certeza de que a performance do sistema como um todo não será melhorada.

Mas a maioria dos programas de melhoria de sistemas se concentra em melhorar as partes separadamente, não em melhorar o todo. Isso pode ser provado rigorosamente através de um exemplo simples.

De acordo com o New York Times existem 457 diferentes modelos de carro nos EUA. Vamos comprar um de cada e colocar uma enorme garagem. Então, vamos contratar 200 dos melhores engenheiros automotivos do mundo e eles determinarão qual dos carros possui o melhor motor. Suponha que eles digam que o melhor motor é o do Rolls Royce.

Qual tem o melhor sistema de transmissão? Eles testam e dizem que o Mercedes tem a melhor transmissão. Qual tem a melhorar bateria? Eles voltam e dizem que o Buick tem a melhor bateria.

Uma a uma eles determinam qual a melhor peça dos automóveis. Você pega a lista das melhores peças, entrega para os engenheiros e diz: “removam essas peças dos automóveis e montem com elas o que vai ser o melhor automóvel de todos, porque o carro consistirá das melhores peças possíveis de um carro.

Qual será o resultado? Você não terá nem mesmo um automóvel, por um motivo obvio: as peças não se encaixarão. A performance de um sistema depende de como as peças se encaixam, não de como elas atuam separadamente.

Para reflexão – um fundo de pensão visando sua existência, sua continuidade futura pode atrair novos participantes, pode atrair novas patrocinadoras, pode ter uma estratégia de marketing “top”, a melhor do mundo, pode equacionar o desafio do fomento. Porém, sem uma nova estrutura, novos processos, nova dinâmica de governança, sem diversidade de pensamentos, visões de mundo, experiencias e conhecimentos de seus conselheiros, as “peças” não se encaixam e esse fundo de pensão não terá futuro.

Você quer construir o fundo de pensão da era digital, desenhar o fundo de pensão do futuro? Pense como um arquiteto, o profissional que melhor “saca” sobre sistemas, que entende a ideia fundamental por trás dos sistemas.

Quando um cliente diz para um arquiteto: “quero construir uma casa com três quartos (suítes), uma sala de estar, uma sala de jantar e uma cozinha, uma garagem para dois carros, quero tudo num andar só e não quero que custe mais do que R$ 50 mil”.

O que o arquiteto faz? Ele tem uma serie de propriedades que o cliente deseja. Será que ele se senta e começa a desenhar a cozinha, os quartos, as salas, a garagem?

Claro que não, ele começa com um desenho geral da casa e então, produz um desenho dos quartos que se encaixem no desenho geral da casa. Durante o processo, ele descobre que pode modificar o desenho geral da casa de tal forma que vai melhorar a qualidade dos quartos. Ele nunca vai modificar o desenho geral da casa para melhorar os quartos, a menos que a qualidade geral da casa seja melhorada simultaneamente.

É esse, fundamentalmente, o princípio que deve ser usado para redesenhar o fundo de pensão que quiser sobreviver na era economia digital. Não adianta redesenhar apenas uma parte, um componente do fundo de pensão, sem pensar como isso vai melhorar, simultaneamente, o fundo de pensão como um todo. 

Lição # 3 – Livrar-se de deficiências, não melhora a eficiência de um sistema

Essa lição decorre do trabalho de Walter Shewhart, do Bell Labs, que desenvolveu nos anos 1930 uma técnica estatística para encontrar defeitos.

Defeito é uma coisa que está errada ou não está funcionando.

Deveria ser óbvio: quando você se livra de algo que está errado, de algo que você não quer, não necessariamente você obtém algo que você quer. Em outras palavras, encontrar deficiências e se livrar delas não é a maneira correta de melhorar a performance de um sistema.

Isso é fácil demonstrar. Se você ligar a televisão nesse exato momento, qual a probabilidade de estar passando um programa que você goste? Essa probabilidade é de 0,01. Esse é um “defeito” do qual você pode se livrar facilmente, tudo que você precisa fazer é mudar de canal.

Qual a probabilidade, agora, de aparecer nesse canal um programa que você queira ver? Continua 0,01 o que conjugado com 50% de probabilidade (por ser a segunda vez que você tenta) de você ver algo, reduz ainda mais essa chance.

Ou seja, a melhoria em um programa precisa ser direcionada aquilo que você quer, não aquilo que você não quer. Redesenhar um sistema – não para o futuro, mas para hoje – requer você perguntar a si mesmo o que faria nesse momento, se pudesse fazer o que quisesse.

Se você não souber o que fazer quando você pode fazer o que quiser, você acha que poderá fazer o que quiser quando houver restrições ao que pode ser feito? O problema é que as pessoas não se fazem essa pergunta.

Para reflexão – se não houvesse restrições legais, nem de recursos, nem política, nem operacionais, nem de forma alguma, se você fosse livre para fazer o que quisesse, o que você faria para redesenhar seu fundo de pensão de modo que ele continuasse a existir para fornecer segurança financeira futura para as pessoas? Te garanto que a esmagadora maioria dos conselheiros e dirigentes de fundos de pensão nunca se fez essa pergunta e provavelmente, não sabe a resposta ...


Credito de Imagem: https://blog.glugmvit.com


Lição # 4 – Melhoria contínua é tão importante quanto melhoria descontínua

Criatividade é uma descontinuidade. Um ato criativo quebra toda a corrente daquilo que veio antes dele, não é algo contínuo.

Ninguém se torna líder melhorando continuamente, isso é imitar o que os líderes estão fazendo. Você nunca ultrapassa o líder (de mercado), apenas melhorando um pouquinho o que o líder faz.

Você só ultrapassa o líder se pular na frente dele, se ultrapassar aqueles que estão a sua frente e isso tem a ver com criatividade.

Quando olhamos os modelos de qualidade, frequentemente consideramos o que os japoneses fizeram no setor automotivo. Não resta dúvida de que eles melhoraram a qualidade dos carros, mas é o tipo errado de qualidade.

Peter Druker, o Papa da administração de negócios do Século XX, conceituou muito bem a diferença entre fazer certo as coisas e fazer a coisa certa. Os japoneses estão fazendo certo as coisas, mas estão fazendo a coisa errada. Fazer certo a coisa errada é a mesma coisa que fazer errado a coisa certa.

Olhe o que acontece na Cidade do Mexico ou em São Paulo e Santiago, onde há rodízio de automóveis por causa dos congestionamentos, onde crianças tem que ficar em casa sem ir a aula em função da poluição intensa. Os carros estão destruindo a vida urbana nas grandes cidades ao redor do mundo.

Se você prestar a atenção a qualidade dos carros que trafegam por essas cidades vai perceber que são automóveis de altíssima qualidade, mas o conceito errado de qualidade.

Qualidade precisa conter a noção de valor, não meramente de eficiência. Trata-se da mesma diferença entre eficiência e eficácia. Qualidade tem que ser direcionada pela eficácia.

E a diferença entre eficiência e eficácia é a mesma diferença entre conhecimento e sabedoria. Infelizmente nos defrontamos hoje com uma escassez de sabedoria.

Para reflexão – Na era digital, as soluções que os fundos de pensão estão buscando para entregar segurança financeira futura para as pessoas, precisam conter a noção de valor para os indivíduos, não meramente de eficiência para os próprios fundos de pensão.

Até que os conselhos deliberativos e as diretorias executivas, líderes e gestores, levem em consideração a natureza sistêmica dos fundos de pensão, a maioria de seus esforços para melhorar sua performance e assegurar sua sobrevivência futura, estarão fadadas ao fracasso.  


Grande abraço,

Eder.



Disclaimer – Esse artigo foi baseado em uma apresentação feita em 1994 pelo Dr. Russ Ackoff sobre a diferença entre “melhoria contínua” e “melhoria descontinua”, sob a ótica de sistemas. Quem tiver interesse no vídeo completo, aqui vai: https://youtu.be/OqEeIG8aPPk?si=TCeBw9UttKQSR_Od




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