De Sāo Paulo, SP.
O futuro da aposentadoria nāo está no contracheque dos fundos de pensão, ele está na nuvem - e não é aquela lá no céu.
A inteligência artificial está se infiltrando silenciosamente em nossas vidas e para quem tem mais de 60 anos, ela moldará as últimas décadas muito mais do que a previdência social ou os fundos de pensāo jamais moldarão.
A geração que achou revolucionário poder enviar uma folha de papel por fax para o outro lado do mundo, está prestes a ver sua vida controlada por modelos de machine learning, análises preditivas e chatbots que os conhecerão melhor do que seus filhos.
1. O plano de saúde digital que você nunca contratou
Os idosos não serão monitorados por médicos, enfermeiros ou mesmo familiares, mas sim por algoritmos.
Dispositivos vestíveis, conectados à sua roupa, saberāo quando você estiver andando mais devagar, quando sua frequência cardíaca oscilar, quando você se esquecer de tomar seu remédio.
Enviarāo uma notificação para um servidor, o servidor notificará um médico, o médico notificará você ... mesmo que você só esteja comendo sua torrada matinal.
Nāo, isso não é o futuro, isso já está acontecendo.
Detetores de queda, com inteligência artificial, rastreadores de demência com análise de voz e até vasos sanitários inteligentes que testam a composição química da urina, são produtos reais e já disponíveis.
O que talvez fique pra trás é a dignidade ...
2. O planejador financeiro de IA que nunca dorme
Antigamente, obter ajuda para você se preparar para a aposentadoria significava falar com um técnico do seu fundo de pensāo que explicava conceitos atuariais do seu plano de previdência complementar que você não entendia.
Esse tempo acabou.
Agora, robôs-consultores baseados em modelos de IA estão substituindo esses técnicos e os planejadores financeiros humanos, processando carteiras de investimento em velocidades que nenhum ser humano conseguiria igualar.
Eles prometem te economizar em taxas de administração e otimizar os resultados da sua poupança de longo prazo.
Mas os algoritmos não se importam se você se divorciou aos 62 anos, se você quer ajudar sua filha a fechar as contas dela em determinado mês ou se você quer deixar algum dinheiro para o seu neto.
Eles são programados para eficiência, não para o contexto humano complexo. Um algoritmo pode garantir sua solvência, mas deixá-lo infeliz. Pode maximizar o retorno, mas eliminar a alegria de um gasto com cunho emocional.
Para quem tem mais de 60 anos, que na verdade tem menos anos para aproveitar a vida, a fria matemática da otimização pode se tornar uma camisa de força.
A fase de aposentadoria não foi feita para ser financeiramente eficiente. Foi feita para ser vivida.
3. CaaS - companhia como serviço
Um dos problemas mais comuns entre adultos com mais de 60 anos é o isolamento social. Entāo, surgem os chatbots de IA, comercializados como companhia.
Eles ouvem, eles respondem, eles se lembram das suas histórias, eles até flertam contigo, se você quiser. Parece meio surreal, até você perceber que eles já estāo entre nós.
Idosos estão adotando amigos de IA mais rápido do que qualquer um imaginava. Não porque acreditem que os robôs sejam reais, mas porque os bots sāo consistentes.
Ao contrário de familiares humanos que esquecem de ligar porque estão ocupados lutando para sobreviver ou de vizinhos que se mudam, os bots nunca se cansam de você.
É, pode parecer cena de filme distópico, mas para uma viúva na zona rural de MG que não tem uma conversa de verdade há dias, a voz numa caixa de som inteligente pode ser a única coisa que a impede de mergulhar na depressão.
É fácil zombar das soluções, até que você seja a pessoa sentada sozinha às 21h, encarando em silencio um filme na Netflix.
Há riscos. Imagine se a empresa que opera esse bot decidir “monetizar o engajamento” incentivando a vovó a comprar suplementos ou votar de determinada maneira?
4. Ter mobilidade sem ter um carro
A compra do último carro é um momento simbólico para a maioria dos aposentados.
Mas, em breve, ter um carro será opcional. Táxis autônomos, compartilhamento de viagens e sistemas de entrega automatizados farão com que o transporte tenha menos a ver com dirigir e mais com ser conduzido.
Por um lado, isso é libertador. Idosos que precisam abrir mão de suas chaves de carro muitas vezes experimentam uma perda psicológica devastadora de independência. A inteligência artificial promete mobilidade sem o receio de colocar os outros em risco.
Imagine ter 85 anos e ainda poder ir jantar, ir a uma consulta médica ou à casa de um parente sem precisar contar com a carona de um amigo ou familiar.
Sem dúvida é melhor depender de um aplicativo para transporte do que de alguém com boa vontade. É preferível ter sua independência atrelada a um data center nos EUA do que ao carro do seu vizinho.
5. A manipulação na era do algoritmo
As gerações mais novas cresceram com sistemas de recomendação turbinados por algoritmos. Elas sabem quando a Netflix as direciona para assistir a mais um filme ou quando o Spotify as manipula discretamente para ouvir a mesma playlist.
Pessoas idosas geralmente não percebem essas sugestões direcionadas.
Isso importa, porque quando a IA recomenda não apenas músicas ou filmes, mas tratamentos de saúde, decisões financeiras e até mesmo amizades, as consequências potenciais são bem maiores.
Um algoritmo projetado para maximizar engajamento não se importa se a vovó realmente precisa de outro comprimido para a memória ou se apenas clicou em artigos demais sobre Alzheimer.
Os idosos são mais vulneráveis porque não foram criados para enxergar os algoritmos como manipuladores. Eles tendem a presumir autoridade enquanto os mais jovens presumem parcialidade e essa falta de confiança pode ser maldosamente explorada.
6. Longevidade: a nova força política
A IA não moldará o poder político dos idosos. Padrões de votação podem ser analisados e segmentados com precisão cirúrgica.
Os idosos constituem um bloco eleitoral de grande influência e a segmentação por IA poderá levar ao eleitorado mais manipulável da história.
Pense nisso: um aposentado de 70 anos passa mais tempo online, consome mais notícias locais e é mais facilmente alcançado por meio de anúncios do que alguém com 35 anos que se divide entre o trabalho e a creche.
Os algoritmos sabem disso.
8. A vida digital após a morte
A inteligência artificial não para quando você morre. A novidade mais recente sāo os “bots legados“ que imitam sua fala, suas memórias e até mesmo seus trejeitos.
Seus filhos poderão “conversar” com você depois que você partir.
Para os idosos, isso é ao mesmo tempo assustador e sedutor. A ideia de deixar para trás não apenas um álbum de fotos, mas um fantasma digital depois que eles morrerem é fascinante.
Isso também altera a forma como as famílias vivenciam o luto. Em vez de se despedirem, elas continuam conversando com uma simulação. Isso pode trazer conforto, mas também pode prendê-las em um ciclo interminável inconcluso, onde o desfecho nunca chega.
A morte costumava ser definitiva, agora, corre o risco de se tornar interativa.
9. Aposentadoria algorítmica
A aposentadoria deveria ser o momento em que o mundo pararia de lhe dizer o que fazer. Ironicamente, pode se tornar o período em que sua vida se tornara mais programada.
Algoritmos decidirão quando você toma seus remédios, como você investe seu dinheiro, para onde você vai amanhã, com quem conversa e até mesmo como seu espírito permanecerá por aqui após sua morte.
Para quem tem mais de 60 anos, o desafio não é apenas se adaptar às novas ferramentas. É decidir se isso tudo vale a pena.
Envelhecer com algoritmos pode significar uma vida mais longa, menos solidão, maior independência e um final de vida mais tranquilo. Também pode significar abrir mão dos últimos resquícios de liberdade que você pensava ter.
O futuro da aposentadoria não é um lugar de descanso. Não é uma comunidade. Não é um navio de cruzeiro. É um sistema operacional e a pergunta simples é:
É você quem o controla ou ele controla você?
Grande abraço,
Eder.
Opiniões: Todas minhas | Fontes: “Aging With Algorithms: How AI Will Rewire the Over-60 Experience”, escrito por Troy Breiland.






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