De São Paulo, SP.
Bancos e fundos de pensão lutando pela sobrevivência
Se você olhar para o preço das ações dos bancos, no mundo todo, vai notar que eles estão passando por um momento difícil. A perspectiva de lucro nos próximos quatro ou cinco anos não está com cara muito promissora e o problema parece ser, fundamentalmente, o modelo de negócios.
As taxas de juros estão num patamar historicamente muito, muito baixo, em alguns países até negativas. Os modelos de risco não permitem que os bancos emprestem dinheiro no mercado atual. Os bancos não têm a menor ideia de como emprestar dinheiro nesse cenário, não sabem o que seria uma boa operação de crédito no meio de uma pandemia. Quem está trabalhando no sistema financeiro hoje nunca passou por isso antes.
O modelo de crédito dos bancos foi construído com base em centenas de anos de experiência, mas o mapa não mostra nenhum caminho para atravessar uma pandemia. A menos que tenham uma mesa de “trading”, pode-se projetar uma diminuição de 50% a 60% na receita dos bancos, ou seja, perdas elevadas à frente.
Aí você olha para o lado e vê o PayPal, o Square e um monte de fintechs que trabalham com meios de pagamentos, bombando e em plena expansão. As receitas do Paypal cresceram 50% ano após ano, as do Square 70%. O PayPal tem hoje um valor de mercado tão grande quanto o do JP Morgan e o Square é do tamanho do Goldman Sachs.
As fintechs são a ameaça # 1 aos bancos, diga-se de passagem, uma ameaça massiva e vamos combinar, se elas estão ganhando dinheiro porque os bancos estão perdendo?
O mesmo vale para os fundos de pensão. A quantidade de fundos de pensão vem diminuindo ano após ano. Seja em busca de economia de escala ou de olho em uma governança melhor, esse movimento vem acontecendo nos quatro cantos do mundo.
De acordo com o banco central holandês a quantidade de fundos de pensão no país diminuiu 75% nos últimos 20 anos. Na Austrália existiam 7.000 fundos de pensão em 2006, em 2016 restaram 2.000. No Brasil, de acordo com relatório da PREVIC publicado no início desse ano, fomos de 348 fundos de pensão em 2011 para 292 em fevereiro de 2020.
Ainda vem o Covid-19 e dá um tapa na poupança de longo prazo. Em vários países os trabalhadores que perderam o emprego estão antecipando o resgate de suas poupanças de longo prazo para sobreviver. Além disso, com taxas de juros baixas, passada a fase de valorização dos investimentos em renda fixa devido a marcação a mercado, os fundos de pensão terão muita dificuldade para entregar os retornos necessários para formação de uma poupança previdenciária adequada no longo prazo. Com retornos menores, as pessoas simplesmente terão que juntar dinheiro por muito mais tempo antes de começaram as retiradas.
Aí você olha para o lado e vê o mercado de criptoativos bombando. Se ao invés de comprar um IPhone 4 em 2010 você tivesse comprado Bitcoins, teria hoje R$ 1,16 bilhões. Caramba, é isso mesmo? É! O mercado de ativos digitais deu um salto gigantesco nos últimos três anos. Apenas de um ano para cá, o valor alocado em ativos digitais, contratos inteligentes, protocolos e aplicações descentralizadas construídos em única plataforma de blockchain, a Ethereum, aumentou 1.972% pulando de US$ 544 milhões para US$ 11,270 bilhões (gráfico abaixo).
O que fintechs e projetos de DeFi fazem diferente?
Eles começaram identificando determinado problema de mercado, desenvolvem uma solução e depois procuram uma forma de ganhar dinheiro. Square e PayPal, por exemplo, definiram que seu negócio seria construído para ajudar as pessoas a transferirem dinheiro. Perceberam que era muito complicado para qualquer mortal, mover dinheiro do ponto A para o ponto B no sistema financeiro.
O ponto de partida foi o consumidor, para resolver o problema do consumidor eles identificaram qual a tecnologia seria necessária. Como uma espécie de consideração secundaria foi que buscaram maneiras para ganhar dinheiro a partir dos produtos financeiros, empréstimos e outras operações.
Já os bancos, a resposta é que eles ganham dinheiro recebendo depósitos a vista e concedendo empréstimos. Não importa qual é a pergunta, eles já têm uma resposta.
O mesmo acontece com os fundos de pensão que continuam entregando a mesma solução para um problema que mudou faz tempo. Os conceitos de aposentadoria e vínculos de trabalho são hoje totalmente diferentes daqueles que fizeram o velho Bismark criar o conceito de previdência. Sem falar que se vive muito mais do que naquela época, várias décadas a mais.
No entanto, o modelo de negócios dos fundos de pensão ainda considera que: (i) as pessoas irão parar de trabalhar abruptamente quando atingirem determinada idade; e (ii) o vinculo de emprego predominante é regido por um contrato de trabalho igual ao da era industrial: 44 horas por semana, descanso semanal remunerados, férias e salário fixo pago em folha de pagamentos.
Às vezes esquecemos que existem problemas na sociedade que mudam e precisam ser resolvidos com novas soluções. As empresas tradicionais parecem viver em uma bolha imutável, não percebem que o impacto mais significativo que podem causar no mundo é resolvendo os problemas do consumidor e da sociedade, em eterna evolução.
Essa é a diferença, as fintechs e o novo sistema financeiro digital que vem sendo construído na Web 3.0 com base em MOIP – Money over Internet Protocol estão partindo do zero para resolver os novos problemas, enquanto bancos e fundos de pensão continuam resolvendo os velhos.
Qualquer um poderá ser um banco ou um fundo de pensão
Da mesma forma que os serviços financeiros vão muito além de transferir dinheiro para lá e para cá e concluir pagamentos via app, buscar segurança financeira de forma previdente tem uma abrangência muito mais ampla do que poupar e investir com foco no longo prazo e se proteger de riscos de invalidez e morte no curto prazo.
Todo mundo fala sobre a tecnologia ultrapassada dos bancos e o conservadorismo dos processos que emperram e impedem os fundos de pensão de inovar. Por isso acabaram surgindo fintechs e projetos de finanças descentralizadas que entregam os mesmos serviços que bancos e fundos de pensão, mas não da mesma forma.
Hoje em dia é possível, basicamente, montar um banco ou um fundo de pensão como peças de lego usando soluções desenvolvidas por fintechs e projetos de DeFi e entrar no mercado muito mais rapidamente. Isso com soluções bem completas que vão muito além de um simples aplicativo “peer to peer”, com a vantagem de serem escaláveis e modulares.
Não há limite para forma como as peças de lego podem ser empilhadas o que significa dizer que são ilimitadas as soluções que podem ser desenvolvidas, embutindo e conjugando serviços financeiros e poupança para a aposentadoria com outras soluções. É daí que surge o conceito de ecossistema de soluções, que veremos mais adiante nesse artigo.
A maneira mais fácil de visualizar isso é através da explicação dada por Matt Harris da Bain Capital Ventures sobre o que está acontecendo com as fintechs. Matt disse que as novas soluções financeiras – fundos de pensão incluídos – estão se tornando a 4ª plataforma da Internet.
A 1ª plataforma é a própria Internet, a 2ª a computação | armazenamento em nuvem, a 3ª a integração com os dispositivos móveis. Ele diz que as novas tecnologias financeiras são tão grandes e tão importantes quanto as outras três e que tudo plugado na Internet vai passar a ser definido como fintech.
Chegamos em um ponto em que os serviços financeiros passarão a ser embutidos e oferecidos por todo tipo de empresa. Quando necessários, estarão lá.
O Shopify, por exemplo, te ajuda a construir um website e te ajuda a receber pagamentos através do website. Também te ajuda a gerenciar a logística de entrega dos produtos. Se você precisar, eles te emprestam dinheiro para desenvolver seu negócio e ainda te dão um cartão de débito para você controlar o movimento financeiro no dia-a-dia. O Shopify não é um banco, mas fornece serviços financeiros.
Os bancos vão desaparecer e serão substituídos por negócios que resolvem os problemas dos clientes oferecendo serviços e soluções financeiras, como o Shopify. No fim das contas, não apenas todo negócio, mas todo individuo tem um problema financeiro para resolver ou precisa de um serviço financeiro.
A fronteira entre bancos, fundos de pensão, serviços financeiros, poupança de longo prazo, risco de invalidez e morte vão desaparecer.
Essa é a primeira de quatro partes desse artigo. Na segunda parte você entenderá o conceito de previdência lego e porque essa mudança de paradigma provocará uma verdadeira revolução no segmento de previdência complementar.
Fique ligado!
Grande abraço,
Eder.
Fonte: Adaptado do webinar “Innovation Trailblazer Series: Digital Ecosystems & The Future of Life, Annuites and Benefits”, da SVIA – Silicon Valley Insurance Accelerator e do podcast “Fintech Can Be a 1.5 Bridge Into 2.0 DeFi, no qual Camila Russo do The Defiant entrevista Simon Taylor da 11:FS.
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